Diário de um pai aos 15

Na história de Fernando Tavares [nome fictício], tem um capítulo que ele, às vezes, ainda tem receio de contar – com 24 anos, o jovem tem uma filha de nove.

Fernando foi pai aos 15 anos, quando estava no 1º ano do Ensino Médio em uma escola privada no município de Xerém, região metropolitana do Rio de Janeiro. Ele e a mãe da criança namoravam há cerca de seis meses quando a namorada anunciou a gravidez. Fernando tentou convencê-la a realizar um aborto e a jovem teria dito que estava providenciando a retirada do feto, mas mentia – a menina, pouco mais velha que Fernando, queria ter o filho.

“O namoro já não estava indo bem e ela começou a me chantegear dizendo que se eu terminasse com ela, ela não tiraria o bebê”, lembra.

A relação dos dois continuou até que ele descobriu que na verdade a namorada não estava tentando o aborto. O jeito foi aceitar a gravidez. Aos prantos, o menino de 15 anos contou a mãe o que estava acontecendo. A futura avó teve uma dupla reação: chorava junto com o filho de preocupação e sorria pelo fato de ser avó.

“Eu não tinha estrutura nenhuma e não era independente, então, minha mãe acompanhava tudo, foi comigo até a casa da mãe da minha filha conversar com a família dela”.

A filha de Fernando nasceu prematura, aos seis meses. Mas, nas contas do pai, a criança já completava nove meses de gestação. Foi quando ele descobriu que a namorada ainda não estava grávida quando deu a notícia para ele, mas sim, planejava a gravidez. Fernando acredita que a namorada mentiu para que a relação dos dois não terminasse e, inclusive, para que, posteriormente, ela fosse morar na casa da família dele, de situação financeira melhor que a dela.

O melhor aluno e um pai ausente

A vida do estudante secundarista mudou bastante, inclusive na escola. Ele começou a estudar como nunca havia feito antes e em pouco tempo, era o melhor aluno da turma, logo ele, que até então, tinha sido um estudante mediano.

“Eu estudava o dia inteiro. No segundo ano já estava estudando para o vestibular e vendo matérias do 3° ano. Não sei se joguei a expectativa de amadurecer para os estudos. Eu pensava que eu tinha que passar para uma universidade publica. Ao contrário de outras famílias, minha mãe não me deixaria parar de estudar para trabalhar e sustentar a minha filha, então eu estudava freneticamente”.

O sustento da criança era em parte bancado pela avó paterna. Mas Fernando recebia uma pensão do pai e fazia questão de dar metade desse dinheiro para a filha. “Por questão de orgulho um pouco”, diz.

Apesar da ajuda financeira, o jovem conta que quando a filha nasceu não conseguia aceitar a situação e chegou a passar mais de um mês sem visitá-la. A avó paterna ia visitar a criança, chamava o filho, e ele não a acompanhava.  Hoje, Fernando atribui essa reação em parte à relação conturbada que mantinha com mãe da criança. Como para visitar a filha, ele precisava encontrar com a mãe da menina, ele evitava a situação. Por outro lado, Fernando reflete que pode ter havido também receio em assumir a responsabilidade como pai.

A essa altura, o estudante já estava participando de sessões de terapia incentivado pela mãe, que dizia que o filho estava ficando agressivo. Em uma das últimas sessões que participou a psicóloga disse que ele não precisava ter medo da filha não gostar dele.

“Isso ficou bem claro para mim, meu maior medo era a minha filha não me amar tanto, assim como eu não amava tanto o meu pai também. Eu falava com a minha mãe que não queria ser o pai que o meu pai foi para mim”, acentua.
 
Fernando vai presentear a filha com uma bicicleta

Quando a filha já tinha seis meses, a ex-namorada telefona para Fernando: “Olha só, você não vai procurar a sua filha não? Então, vou ensiná-la a chamar outra pessoa de pai”.

O jovem pai considera que nesse momento ele despertou para a necessidade de estar mais presente na vida da filha. “Eu desliguei o telefonei e chorei muito. Eu estou fazendo por onde ela não gostar de mim, pensei. Logo eu que tinha tanto medo disso”.

Desde então, quinzenalmente, aos finais de semana, o pai busca a filha para a sua casa, que também é a casa da avó paterna. Isso quando a garotinha, com nove anos, não liga para o pai antecipadamente pedindo para ir para lá. Certa vez, Fernando não pôde contar com a ajuda da mãe e da irmã, que geralmente iam com ele buscar a filha de carro, e se aventurou a buscá-lá sozinho de ônibus. O resultado foi que a criança vomitou no caminho e o pai ficou todo atrapalhado.

Hoje, Fernando, já está perto de concluir o curso de direito em uma universidade pública e passou recentemente em um concurso público. A situação financeira melhorou e ele agora não depende mais da mãe para sustentar a filha.

“O aniversário da minha filha está próximo e agora poderei comprar uma bicicleta para ela”, alegra-se.

Na faculdade, poucos amigos sabem que Fernando é pai. Onde morava antes, em Xerém, ele conta que a realidade era diferente porque era muito comum os adolescentes serem pais. “Quase todos os meus amigos de lá já são pais. Na universidade, tem uma elitezinha que julga muito, então eu não contava que eu tinha uma filha. Na minha turma, pouca gente sabe”.

Nove anos depois de a filha nascer, o jovem insiste em ser um pai dedicado, mesmo morando distante. “Ligo para ela quase todos os dias para perguntar se ela escovou os dentes, se almoçou, se fez o dever de casa”.

A história de Fernando é verdadeira, o EMdiálogo decidiu de comum acordo com a fonte, trocar o nome  do personagem para não expor desnecessariamente todas as pessoas envolvidas na história. Agradecemos a confiança deste jovem pai.

 

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