Prof. Luiz Ferraz Netto
Quando falamos sobre o "gato de Schrödinger" estamos nos referindo a um paradoxo que aparece a partir de um célebre experimento imaginário proposto por Erwin Schrödinger em 1937, para ilustrar as diferenças entreinteração e medida no campo da mecânica quântica.
O experimento mental consiste em imaginar um gato aprisionado dentro de uma caixa que contém um curioso e perigoso dispositivo. Esse dispositivo se constitui de uma ampola de frágil vidro (que contém um veneno muito volátil) e um martelo suspenso sobre essa ampola de forma que, ao cair, essa se rompe, liberando o gás venenoso com o qual o gato morrerá. O martelo esta conectado a um mecanismo detetor de partículas alfa, que funciona assim: se nesse sensor chegar uma partícula alfa que seja, ele é ativado, o martelo é liberado, a ampola se parte, o gás escapa e o gato morre; pelo contrário, se nenhuma partícula chegar, nada ocorrerá e o gato continuará vivo.
Quando todo o dispositivo estiver preparado, iniciamos o experimento. Ao lado do detetor colocamos um átomo radioativo que apresente a seguinte característica: ele tem 50% de probabilidade de emitir uma partícula alfa a cada hora. Evidentemente, ao cabo de uma hora só terá ocorrido um dos dois casos possíveis: o átomo emitiu uma partícula alfa ou não a emitiu (a probabilidade que ocorra um ou outro evento é a mesma). Como resultado da interação, no interior da caixa o gato estará vivo ou estará morto. Porém, isso não poderemos saber --- a menos que se abra a caixa para comprovar as hipóteses.
Se tentarmos descrever o que ocorreu no interior da caixa, servindo-nos das leis da mecânica quântica, chegaremos a uma conclusão muito estranha. O gato viria descrito por uma função de onda extremamente complexa resultado da superposição de dois estados, combinando 50% de "gato vivo" e 50% de "gato morto". Ou seja, aplicando-se o formalismo quântico, o gato estaria por sua vez 'vivo' e 'morto'; correspondente a dois estados indistinguíveis!
A única forma de averiguar o que 'realmente' aconteceu com o gato será realizar uma medida: abrir a caixa e olhar dentro. Em alguns casos encontraremos o gato vivo e em outros um gato morto.
Por que isso?
Ao realizar a medida, o observador interage com o sistema e o altera, rompendo a superposição dos dois estados, com o que o sistema decanta em um dos dois estados possíveis.
O senso comum nos predispõe que o gato não pode estar vivo e morto. Mas a mecânica quântica afirma que, se ninguém olhar o interior da caixa, o gato se encontrará numa superposição dos dois estados possíveis: vivo e morto.
Essa superposição de estados é uma conseqüência da natureza ondulatória da matéria, e sua aplicação à descrição mecânico-quântica dos sistemas físicos é que permite explicar o comportamento das partículas elementares e dos átomos. A aplicação disso aos sistemas macroscópicos como o gato ou, inclusive, se assim o preferir, a qualquer professor de física quântica, nos levaria ao paradoxo proposto por Schrödinger.
Curiosamente, alguns livros de física, para colaborar com a 'lei dos direitos dos animais', substitui nesse dispositivo experimental (hipotético) a ampola com veneno por uma garrafa de leite que ao romper-se, permite ao gato alimentar-se. Os dois estados possíveis agora são: "gato bem alimentado" ou "gato esfomeado". O que, também, tem sua parcela de crueldade.
Comentário
Quando se recorre á imagem do "gato de Schrödinger" já sabemos que estamos nos referindo a um dos aspectos mais singulares e misteriosos da mecânica quântica, a saber, que tais fenômenos quânticos necessitam, para ocorrer, da consciência de um observador. Explico melhor: quando se produz o colapso da função de onda de uma partícula --- que, segundo os 'entendidos' possui consistência ondulatória e corpuscular indistintamente --- esta pode resultar com um dado sinal (para seu 'spin') (+) ou outro (-), porém, enquanto alguém, um observador, não constatar, esse resultado não existe.
Não é que o resultado seja positivo ou negativo (todavia, desconhecido), não, é mais estranho ainda: o novo estado da partícula em questão (e suas possíveis conseqüências) não existe de nenhuma maneira até que seja verificado pela observação. Ainda não entenderam? Certo, junte-me a essa lista.
Richard Feymann, premio Nobel de Física, já dizia: "quem não ficar pasmado com a física quântica é porque não a compreendeu". Pasmem!
Como ninguém entendeu nada, vale salientar que esse experimento mental tem outra versão: no exterior da caixa há uma partícula cuja função de onda entra em colapso; se o resultado do colapso resultar uma partícula com spin positivo o sensor acusa e o gato morre, se resultar com spin negativo o sensor nada acusa e o gato vive. Até que se observe o interior da caixa, o gato estará vivo e morto.
A imagem desse "gato", na física quântica, pelo menos tem uma vantagem, a de evitar repetir tediosas explicações como o princípio da incerteza, a simultaneidade do caráter ondulatório e corpuscular das partículas e outros detalhes técnicos desse peculiar campo da física.
Comments
Essa estranha física!!
Comentarei esta afirmação: "quem não ficar pasmado com a física quântica é porque não a compreendeu". Quem compreende por pouco que seja os eventos quânticos fica pasmado! É realmente uma viagem dar explicações de acordo com a física quântica, uma vez que nossa mente tem que sair da física clássica, ao mesmo tempo em que tem de se relacionar com ela.
Certa vez me deparei com esse dilema, e consegui entender duas formas diferentes de interpretação sobre os "pacotes de energia", ou seja, os quanta de energia emitidos pela matéria. Se você subir uma escada, não passará de um degrau a outro com qualquer tamanho de passo (tem que ser da altura de um degrau, no mínimo). A menos que os degraus dessa escada aumentem infinitamente, e a altura dos mesmos vá ficando muito pequena, você terá que dar passos menores, praticamente contínuos, embora ainda discretos. Assim são os pacotes de energia, discretos... mas se seus olhos (ou detectores) captarem eles tão próximos um do outro, dirão que são contínuos. Poderão até dizer que você está subindo uma rampa em vez de uma escada.
A física é assim mesmo, "depende do ponto de vista do qual você vê ou pensa" - como o paradoxo do gato, que pode estar vivo ou morto (no pensamento clássico) ou vivo e morto (no pensamento quântico). A analogia com os degraus da escada me esclareceu que os quanta de energia são discretos ou contínuos (no pensamento clássico), mas são discretos e contínuos (no pensamento quântico). A natureza da luz, como onda e partícula simultaneamente, também exige interpretações que pasmam as pessoas da mesma forma !!!