Em entrevista ao EMdiálogo, a professora chilena Maria Angélica Oliva explica porque a Lei Geral de Educação naquele país rompeu muito pouco com a lógica privatizante da ditadura militar
No Chile, escolas passaram a fazer parte da administração dos municípios e os professores perderam a sua condição de funcionários públicos. Essas são duas das conseqüências listadas pela professora da Universidade de Talca, no Chile, Maria Angélica Oliva, das políticas para a educação da ditadura militar de Pinochet. A professora ressalta que não há hoje, no país, nenhum plano de governo para mudar a situação, que é parte da política neoliberal adotada no Chile.
Para Maria Angélica, no momento em que se trocou a antiga lei da ditadura militar (LOCE) pela Lei Geral de Educação (LEG), o Chile perdeu uma grande oportunidade de se fazer mudanças radicais.
"Para a transformação radical necessária, era indispensável uma mudança na Constituição Política que rege as leis do país, que ainda hoje é a mesma da ditadura. Se pensamos que a dimensão institucional e de financiamento se constituem dois eixos chaves da política educativa, deveríamos intervir nestes dois assuntos para recuperar e potencializar o caráter público da educação", argumenta.
Pais chilenos tem prioridade na educação dos filhos
A Constituição atual chilena, explica a professora, assegura aos pais o direito à preferência na educação dos filhos, ou seja, eles não são obrigados a matriculá-los numa instituição de ensino.
No Brasil, ao contrário, a Constituição de 1988 indica que esse é um dever do estado, inclusive, os pais podem ser penalizados se não matricularem as crianças na escola. Ainda na Constituição chilena está garantida a liberdade de ensino, que consiste no direito das pessoas de abrirem, organizarem e manterem estabelecimentos educacionais, ainda que existam diretrizes curriculares a serem seguidas pelas escolas. Aliás, é este o princípio que está no bojo da privatização da educação chilena.
"A educação que é um direito e um bem público acaba se transformando numa mercadoria e a vocação política de configurar uma educação democrática cede a vocação de desenhar uma educação com ranços tecnocráticos. Isso coloca em perigo a manutenção de um sistema nacional de educação", observa Maria Angélica.
Reforma educativa única na América Latina?
A professora Maria Angélica Oliva acredita que antes de se pensar em uma reforma educativa única na América Latina, a exemplo do que fez a União Européia, deve se ter em conta que uma mudança no sistema educacional só tem sentido se forem observadas as condições ao seu redor.
"A transformação educativa deve ser funcional à comunidade da qual o sistema educativo faz parte, a seu desenvolvimento sócio-histórico, propiciar o fortalecimento da sua identidade e gerar em seu seio um processo democrático que tenda ao fortalecimento do espaço público", ressalta.
Maria Angélica Oliva questiona também se uma reforma única daria as condições de emancipação necessárias para a América Latina ou se reforçaria o estigma de colonização de nossos países. E você, o que pensa sobre as possibilidades de mudanças na educação da América Latina?