GESTÃO DEMOCRÁTICA ENTRE A ILUSÃO E A UTOPIA

9ª GERED – VIDEIRA – SC
ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA PROFESSORA ADELINA RÉGIS
Sidinei Rui –
Mestre em Educação sidineirui@formatto.com.br
Elcio Alberton –
Mestre em Educação professor.elcio@hotmail.com
Leonardo Eloi Altenhofen
Pós graduado em Educação Física
Rodrigo Nunes dos Santos
Graduando em Biologia
Julio Cesco
Ensino Médio

"É tolice uma sociedade apegar-se a velhas ideias em novos tempos como é tolice um homem tentar vestir suas roupas de criança"
(Thomas Jefferson)

A palavra utopia na sua etimologia significa uma possibilidade a ser alcançada, ao contrário de ilusão cujo significado permanece no campo dos sonhos e do irrealizável. No que se refere à gestão democrática da educação é pertinente começar por desmontar algumas barreiras que as práticas antidemocráticas criaram nas diversas instâncias de governo ao longo da história.
Não é raro ainda na atualidade que servidores públicos usem do seu posto de serviço para exercer poder e desfrutar de influência social, exigindo obediência e respeito. Por sua vez a sociedade, que não foi habituada e raramente vê respeitado o seu direito a participação, também se curva a esse tipo de comportamento e interesse entendendo o papel do servidor e da instituição como um favor que lhe é devido e não como um direito que lhe é garantido.
A redemocratização do País, as garantias constitucionais, o papel dos conselhos paritários fizeram modificar significativamente essa compreensão e prática, mas ela ainda esta presente no inconsciente coletivo e nas equívocas interpretações da legislação ou no desconhecimento delas por uma parcela significativa da população.
Ao contrário de patrimonialismo, espera-se do servidor e das instituições o desenvolvimento da autonomia que não pode e nem deve ser confundida com “anarquia” ou falta de regulação, mas capacidade de caminhar em direção à sua meta respeitada a visão e a missão que lhe é própria  ou para a qual foi instituída na sociedade.
Todavia a falta de democracia na gestão da escola, instituição ainda marcada pelo corporativismo, pelas disputas internas, pelos grupos de interesses, pela hierarquização no interior das escolas e da educação nos estados e municípios, outras vezes resultados da insuficiente preparação humana e intelectual e da falta de investimento na preparação dos sujeitos para relacionamentos interpessoais.
A excessiva hierarquização das instituições públicas que são também ralos burocráticos ainda permite aos diretores de escola deter o controle por meio da “última palavra”, ou do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Neste sentido é comum a falta de comprometimento em detrimento do cumprimento de responsabilidades individuais.
Neste contexto o maior desafio para uma gestão democrática é criar oportunidades de participação de modo sistemático com todos os seus envolvidos. Sobretudo, os pais, apresentam dificuldades de participação em decorrência das situações econômicas, culturais, e institucionais, ambos os fatores empurram os pais para o silêncio, pois fazem com que se considerem inferiores no interior das instituições.
Desenvolver nos pais o conceito de participação ativa é uma necessidade imperiosa para superar a prática patrimonialista presente também no cotidiano das unidades escolares em Santa Catarina bem como nas Gerências Regionais de Educação.  Romper com esta cultura viciada e arcaica implica antes de tudo formação dos docentes e gestores para a participação e para a democracia.
Fazer acontecer gestão democrática, como já se disse no início do caderno V, repetindo afirmações já feitas no caderno II embasadas na legislação vigente, implica mais do que colocar em prática o que determina a lei. No processo de formação inicial dos docentes e na formação continuada falta a percepção de que formação docente não pode se limitar a técnicas didáticas, pedagógicas e conhecimento de leis e princípios. Um dos sérios limites na educação é a formação humana, questões relativas ao SER do professor, à pessoa com suas limitações e necessidades.
A capacidade de organizar reuniões e discussões que redundem em soluções produtivas e evitem posturas corporativas. Isso significa facilitar aos envolvidos a disposição para conversar sobre problemas do cotidiano com maturidade que não envolva interesses pessoais e favoritismos. Gestão democrática não se resume a realização de reuniões que não chegam a lugar nenhum. As discussões coletivas exigem capacidade de argumentação com conhecimento de causa, não basta todo mundo falar tudo, é precisa falar sabendo o que se diz, com fundamentos legais pedagógicos e humanos.
A função de quem dirige uma instituição escolar consiste também na capacidade de criar diálogo sincero entre as partes. Gestão democrática não permite “puxação de tapete”, “culto ao ego do chefe”, “insensação de personalidades”, “desconstrução da imagem alheia”.
Gestão democrática pede muito mais do que respostas rápidas, superficiais, atribuição de culpas e punições. Não faltam motivos para que se estabeleçam processos de gestão democrática coletiva e obviamente o primeiro deles reelaborar coletivamente e com ampla participação o PPP da Escola.

GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇAO OU GESTÃO DEMOCRÁTICA DA ESCOLA
Gerir democraticamente a escola, num contexto onde falta democracia na gestão da educação é um desafio que precisa ser superado com criatividade e competência. Envolver a comunidade escolar é muito mais  do que fazer reuniões onde todo mundo fala o que quer. Gerir democraticamente a educação implica exercitar o diálogo respeitando as diferenças em vista de processos que sejam efetivados no cotidiano onde não tenha lugar para estrelismos e exclusões. (Cf. BRASIL/MEC/SEB. 2004.p.26).
As ações executadas merecem passar por avaliação, o que não significa discussão sem propósitos, ataques pessoais, ou desvalorização do trabalho, mas oportunidade para que as próximas atividades não incorram  nos mesmos erros.
Fazer da participação uma ação democrática significa dialogar e deliberar coletivamente com respeito às posições divergentes. Criar mecanismos de participação supõe ultrapassar a fronteira da conversa piedosa sem chegar ao discurso raivoso da superposição de uns sobre outros onde existam vencedores e vencidos.
Gestão escolar implica criar e dar voz às instâncias deliberativas  e de representação de classe capazes de criar espaço de responsabilidade coletiva.

CONSELHOS ESCOLARES
A participação popular na gestão das instituições públicas é um processo que o Brasil recomeçou a aprender com o declínio da ditadura no final dos anos 1970. As greves do ABC e a constituição dos sindicatos e das centrais sindicais no início dos anos 1980 foram o germe dos conselhos paritários previstos na Constituição de 1988. No caso dos conselhos escolares, estes tem sua legislação prevista na LDB de 1996 que deixou aos estados e municípios a responsabilidade pela sua regulamentação e funcionamento.
Em Santa Catarina os conselhos deliberativos foram instituídos pelo DECRETO nº 3.429, de 08 de dezembro de 1998, no artigo 2º o decreto prevê que sua constituição seja feita por representantes de todos os segmentos da comunidade escolar. O decreto estabelece como funções do Conselho:

Deliberar diretrizes e metas do PPP, propor alternativas para melhorar a qualidade do trabalho escolar, coordenar a elaboração do regimento escolar e o cumprimento do PPP, apreciar e emitir parecer sobre o desempenho das metas, articular mecanismos de execução das políticas educacionais, recorrer a instâncias superiores quando não se julgar apto para propor soluções.

O decreto prevê a proporcionalidade representativa entre os segmentos a qual deve ser garantida por meio de eleição  direta e secreta.
No caso da Escola de Educação Básica Professora Adelina Régis em Videira – SC, os professores cursistas tiveram acesso ao livro atas de constituição do Conselho Deliberativo da Escola, o qual foi constituído a primeira vez no início da década de 2000, e depois, segundo diálogos estabelecidos entre os cursistas, “deixado morrer” porque não estava cumprindo sua função.
No início do ano de 2013, encontra-se uma ata de constituição do Conselho Deliberativo. Este documento descreve a reunião de alguns membros da comunidade escolar com a diretora da escola que nomeou o Conselho Deliberativo, o qual não fez nenhuma reunião desde a sua instalação. A segunda ata desta nova etapa do conselho é a fotocopia de uma ata de reunião que teria sido realizado pelo conselho sob a presidência da Gerente Regional de Educação, cuja finalidade foi confirmar os nomes dos novos assessores de direção da escola que já haviam sido nomeados para o ano letivo de 2014 por indicação político partidária.
Note-se que a existência deste conselho comprova mais uma vez que a gestão democrática da escola, nestas condições é um sonho impossível. E mesmo existindo legalmente o Conselho Deliberativo ele não tem legitimidade.
Chama a atenção nas discussões sobre a constituição e o papel do conselho a falta de clareza sobre a importância e papel desta instância no cotidiano da escola e pior que isso mesmo professores que supostamente conhecem tudo sobre democratização e participantes da direção do sindicato dos professores afirmarem que é inútil convocar a comunidade para a participação, pois “ninguém quer nada com nada”. Neste contexto não é estranho que qualquer voz dissonante seja entendida como “mosca que pousou na sua sopa”
Nota-se no caso em referência que a existência do Conselho, como afirma o módulo V, não é uma garantia de democratização da gestão, já que o processo mediante o qual foi constituído nada tem de participativo e nenhuma decisão foi tomada mediante consulta e expressão dos representados. O módulo V também fala da possibilidade de manipulação e legitimação de decisões autoritárias dos grupos que detém o poder.
Certamente a primeira medida a ser tomada é estabelecer processo de transparência e capacidade de tomar decisões coletivas quebrando os limites autoritários que se escondem nas práticas supostamente participativas.
Compreender os conselhos como espaço pedagógico é ainda um longo caminho para a gestão democrática da educação em Santa Catarina.

GRÊMIO ESTUDANTIL OU CENTRO CÍVICO?
Parte significativa do atual corpo docente das escolas é egresso do sistema de ensino vigente durante a ditadura militar. Não é estranho que reproduzam conceitos e práticas antidemocráticas, já que são frutos do cerceamento de liberdades característicos daquele período. Em relação ao Grêmio Estudantil facilmente poderá ocorrer uma confusão das suas funções, finalidades e a própria constituição com similaridade ao que eram os Centros Cívicos das escolas da ditadura.
No caso do Grêmio Estudantil, diferente dos conselhos escolares, cuja regulamentação ficou por conta dos estados e municípios, o Grêmio estudantil é legislado pela Lei 7.398 de 04/11/1985, e pela lei 8.069 de 13/07/1990 (ECA) no seu artigo 53 item IV: “– Direito de organização e participação em entidades estudantis”.
A novidade desta regulamentação reside no fato que a constituição do Grêmio Estudantil é uma iniciativa do próprio aluno que contará apenas com o estímulo dos professores, neste caso o sujeito e protagonista é o estudante.
Um dos maiores equívocos do Grêmio estudantil é a redução da sua atividade a realização de eventos e promoções. Facilmente o grêmio esquece sua responsabilidade de promoção de debates sobre o projeto pedagógico da escola e sobre a vida cidadã dos estudantes e das suas famílias.
Incentivar e facilitar a organização de processos democráticos é também um processo de compreensão do sentido participativo da gestão de uma unidade escolar. Certamente a finalidade mais importante da organização estudantil é o desenvolvimento de uma ampla e livre participação na tomada de decisão da sua escola.

O PPP EM AÇÃO...
Ao longo de todo o caderno V,  a questão da democracia, da gestão e da participação foi o cerne de todas as discussões, conceitos e estudos. Concluindo este módulo fica ainda mais clara a ideia que democracia consiste num exercício permanente de colegialidade. O PPP e o efetivo exercício da aprendizagem são elementos fundamentais no que se refere a efetiva democratização da escola.
Conhecer a visão e a missão da escola é o desafio mais pertinente para todos os envolvidos na aprendizagem, daí decorre a necessidade de um processo coletivo de construção do PPP. A efetiva participação na construção do projeto político pedagógico é que fará ver com clareza a missão da escola com sua relação de forças e os pressupostos humanos que se quer formar.
Segundo estudiosos, entre eles Ilma Veiga, o PPP é uma ação coletiva e intencional, razão pela qual sua construção deve ser feita com ampla participação da comunidade escolar e que esta tenha autonomia para tomar decisões colegiadas e representativas, só desta forma ele pode ser entendido como participativo.
Uma efetiva participação na construção do PPP exige percorrer alguns passos:
a) Ver a realidade – Conhecer o aluno e a escola  no seu contexto, o que é  muito mais do que levantamento de dados estatísticos;
b) Conhecer a legislação sobre o tema – Realizar rodadas de negociação e conhecimento da legislação pertinente;
c) Construir o PPP coletivamente é mais do que realizar votações e disputas internas, mas estabelecer consenso entre as partes;
Uma vez construído o PPP precisa ser colocado para apreciação da comunidade escolar, que se renova a cada ano, abrindo para ela a possibilidade de sua reconstrução.
A história da educação brasileira não é democrática e o cotidiano das nossas escolas e da gestão da educação como tal também não é. Construir coletivamente o PPP implica criar mecanismos de participação capazes de envolver o maior número de pessoas.
Só um PPP construído coletivamente garantirá que a prática democrática também alcance a sala de aula e um processo de aprendizagem que respeite as diferenças. Deste modo será possível afirmar que a escola começa a cumprir o seu papel de garantir formação humana integral e integradora na qual seja valorizada a auto-organização, o trabalho cooperativo  a problematização e a construção do conhecimento.
A lei de Diretrizes e Bases da  Educação Nacional  (LDB) 9394 de dezembro de 1996,  em seu artigo 14 estabelece que:

Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

A Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina, fala sobre o PPP com as seguintes palavras:
Constitui-se em um documento produzido como resultado do diálogo entre os diversos segmentos da comunidade escolar a fim de organizar e planejar o trabalho administrativo-pedagógico, buscando soluções para os problemas diagnosticados. O PPP, além de ser uma obrigação legal, deve traduzir a visão, a missão, os objetivos, as metas e as ações que determinam o caminho do sucesso e da autonomia a ser trilhado pela instituição escolar. (http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/ppp  acesso em 01/12/2014).

E garantindo o cumprimento da legislação vigente sugere que o PPP deva ser elaborado com a participação de todos os segmentos que constituem a comunidade escolar, para facilitar, oferece um roteiro em oito passos  e conclui com um lembrete:

O PPP deve ser conciso e explícito (15 páginas são suficientes para o que se pretende);
• Não se trata de reprodução de documento antigo; tampouco de um texto  excessivamente detalhista, mas da produção de um texto que trate da realidade administrativo-pedagógica da escola: do diagnóstico à proposta  de metas/ações;
• Trata-se de um documento real que norteará as ações no âmbito escolar. (http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/ppp acesso em 01/12/2014).

No caso da educação, um espaço significativo de participação na sua gestão se deu com a realização da Conferência Nacional de Educação (CONAE) que redundou no Plano Nacional de Educação (PNE 2014 – 2024).
O PNE, uma vez aprovado precisa ser acompanhado pela sociedade a fim de que suas metas sejam efetivadas em todos os níveis das unidades federadas. Esse é um processo que precisa envolver a todos e ser entendido como uma conquista e não como um favor.

REFERÊNCIAS
BAZARRA, Lourdes, CASANOVA, Olga, HUGARTE, Gerônimo Garcia. Ser professor e dirigir professores em tempos de mudança. São Paulo, Paulinas, 2008.
LÜCK, Heloisa (et al). A escola participativa: O trabalho do Gestor Escolar. Petrópolis, Vozes, 2011.
MACHADO, Evelcy Monteiro (et al). Formação do Educador: Educação demandas sociais e utopias. Ijuí, UNIJUÍ, 2007.
PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza e ALMEIDA, Laurinda Ramalho de (Org). O coordenador Pedagógico e o Cotidiano da Escola. São Paulo. Loyola, 2010.
VAILLANT, Denise. Ensinando a Ensinar: As quatro etapas de uma aprendizagem. Curitiba, UTFPR, 2012.
http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/ppp  acesso em 01/12/2014.
http://www.sed.sc.gov.br/secretaria/ppp acesso em 01/12/2014