A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deu passo significativo para modernizar o modo com que a questão das drogas é tratada no Brasil.
Em sessão na quarta-feira (29), aprovou-se o parecer do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), que estipula critérios objetivos para diferenciar o traficante do mero usuário de entorpecentes.
A omissão legislativa quanto a esse ponto vinha tornando praticamente inócuos os avanços obtidos na lei 11.343, de 2006. Já se determinava, naquele momento, que só traficantes fossem punidos com a prisão (até 15 anos), reservando-se para consumidores de drogas o encaminhamento para cuidados médicos ou psicológicos.
Todavia, inexistem parâmetros claros para distinguir uns de outros, o que abre às autoridades larga margem para o exercício do arbítrio, do achaque e do preconceito.
Alguns gramas de maconha no bolso de um jovem negro tendem a fundamentar sua condenação como traficante, mas a mesma quantidade na "nécessaire" de uma profissional bem-sucedida não provocaria efeitos tão nocivos sobre sua vida e sua reputação.
Enquanto isso, cresce o número de pessoas encarceradas por envolvimento com drogas no Brasil. Do mais de meio milhão de presos que havia no país em 2012, cerca de 25% (138 mil pessoas) perderam a liberdade por esse motivo; eram 17% em 2008. É duvidoso que tal contingente correspondesse, com exclusividade, a narcotraficantes.
Cabe lembrar ainda os casos de quem, mesmo sem sofrer condenação judicial, passa pela experiência de ser tratado como criminoso pela posse, ainda que modesta, de alguma substância proibida.
Pelo texto aprovado na CCJ, estabelece-se no equivalente a cinco dias de consumo a quantidade de drogas que deve ser considerada de uso pessoal. Embora exista quem defenda a extensão desse prazo de tolerância para dez dias, a iniciativa ao menos concede à lei em vigor uma real efetividade prática.
Outro prazo de tolerância, porém, estende-se de modo injustificado. É o da tramitação da proposta, que ainda passará por quatro comissões do Senado antes de ir a plenário e, em caso de aprovação, ser examinada pelos deputados.
Sem ser causada pelo ópio ou outro poderoso preparado químico, a letargia do legislador não deixa de ser preocupante e patológica.