Pesquisa do governo federal feita antes das manifestações mostrava a insatisfação dos jovens com a situação política do Brasil
Na primeira semana de junho, o governo federal concluiu uma pesquisa que demonstrava, com valor científico, o que a onda de protestos revelaria nas semanas seguintes. A juventude brasileira interessa-se por política, acha que votar de dois em dois anos é uma participação insuficiente, mas resiste a atuar por meio das formas tradicionais, como os partidos, vistos com desconfiança.
O levantamento detectou também algo curioso. Quando os jovens foram questionados sobre o maior problema do Brasil, a resposta mais comum foi “corrupção”, no cenário em que a pergunta era acompanhada de alternativas de respostas. Mas, quando o jovem podia responder espontaneamente sem escolher opções pré-definidas, preferiu apontar questões sociais, como a “desigualdade”.
Realizada pela Secretaria Nacional de Juventude, a pesquisa foi a campo entre maio e junho. Ouviu três mil jovens moradores de áreas urbanas e rurais. É uma atualização de um trabalho de 2003 feito à época para subsidiar a elaboração de políticas públicas. A nova versão tem o mesmo objetivo e será divulgada na íntegra nos próximos dias.
A definição do que é ser jovem também sofreu atualização. A classificação anterior abrangia quem tinha entre 15 e 24 anos, seguindo uma catalogação tradicionalmente sugerida pelas Nações Unidas. Agora, o recorte foi ampliado para até 29 anos, em linha com o Estatuto da Juventude, recentemente aprovado pelo Congresso Nacional e à espera de sanção presidencial para virar lei.
A quase coincidência com as manifestações fez aumentar, dentro do governo, o valor da pesquisa enquanto bússola do pensamento da juventude. A vontade de interferir nos rumos políticos do País, captada no levantamento e expressa nos protestos, levou a Secretaria a apressar o início da operação de um canal de diálogo do governo com a juventude via internet.
O Participatório (http://www.participatorio.juventude.gov.br) entrou no ar nesta quarta-feira 17. É uma plataforma na qual pessoas e entidades poderão trocar informações, defender ideias, colocar conteúdo, por exemplo. Futuramente, abrigará consultas públicas sobre projetos do governo, processo semelhante ao ocorrido com o Marco Civil da Internet, a lei pró-usuários que o Congresso há dois anos se recusa a votar por causa do lobby das operadoras de telefonia.
“As manifestações foram importantes ao sacudir o governo para a necessidade de criação de novas formas de participação política, não adianta só a reforma política”, disse a CartaCapital a secretaria Nacional de Juventude, Severine Macedo. “Os jovens mostraram que querem um canal mais direto e menos burocrático para dialogar com o Estado.”
Uma proximidade maior com a juventude é necessária para o governo também do ponto de vista eleitoral. É mais difícil tirar proveito usando os avanços que o PT acredita ter promovido no País em uma década, se o alvo da argumentação for um eleitor jovem e com pouca memória dos anos de FHC-PSDB, ponto de partida da comparação petista.
Uma pesquisa Datafolha feita depois das manifestações registrou que, entre eleitores de 16 a 24 anos, a presidenta Dilma Rousseff não lidera as intenções de voto para a eleição de 2014, ao contrário do que ocorre nas outras faixas etárias. O nome predileto do grupo é o de Marina Silva, que bate Dilma por 31% a 27%, em um cenário em que concorreriam ainda o senador Aécio Neves (PSDB) e o governador Eduardo Campos (PSB).