2012, afinal, é o fim do mundo?

Uma inscrição maia tem sido interpretada como um aviso de que o mundo vai acabar no fim deste ano. No entanto, uma análise do complexo sistema de calendários elaborados por essa civilização mostra que essa interpretação catastrófica é equivocada. Este é o tema do artigo de capa da CH 295.

Por: Alexandre Guida Navarro

Publicado em 14/08/2012 | Atualizado em 14/08/2012

Há cerca de 4 mil anos, uma complexa civilização – os maias – surgiu na região da América Central onde estão situados hoje o sul do México, Guatemala, Honduras, El Salvador e Belize. A cultura maia teve seu maior desenvolvimento entre os anos 300 e 900 do calendário cristão, e manteve suas identidades linguísticas e culturais até a invasão da América Central pelos espanhóis, iniciada em 1519.

Ao contrário do que se acredita, porém, os espanhóis não aniquilaram os maias: na Guatemala e no México, principalmente, milhões de descendentes ainda falam línguas maias e mantêm vivos aspectos dessa antiga cultura.

Em seu período áureo, os maias construíram cidades urbanizadas, com templos grandiosos e estradas pavimentadas ligando regiões distantes. Elaboraram um complexo sistema de escrita fonética e ideográfica, o mais sofisticado do continente americano na época pré-colombiana, e registraram sua história e seus conhecimentos em livros de papel (feito da casca de árvores) ou de pele de veado e em monumentos de pedra (as estelas). Poucos de seus livros, denominados códices, sobreviveram à destruição determinada pelos invasores europeus.

 

Foram grandes guerreiros. Várias cenas pintadas nos templos retratam ações militares para a expansão de seus territórios e de seu poder. Além disso, mantinham comércio de longa distância, importando e exportando produtos.

Os maias não viviam em harmonia com o meio ambiente
Recebiam a pedra preciosa turquesa, por exemplo, de áreas de produção a mais de 2 mil km, no território dos atuais Estados Unidos, e exportavam produtos como o jade, pedra de valor inestimável para os maias e outros povos da região, pois sua cor – verde – era associada à vida.

O declínio dos maias começou em meados do século 9, por causa da falta de terras para a produção de alimentos, da intensificação dos conflitos com outros povos e do desmatamento que realizaram.

Desmatamento? Sim, os maias não viviam em harmonia com o meio ambiente. A contínua exploração dos solos sem os cuidados necessários e a destruição da floresta para a construção de espaços urbanos levaram à falta de água e ao aumento da temperatura, fatores que certamente tiveram participação no colapso.

Descobertas recentes
Pesquisas realizadas nos últimos anos vêm modificando alguns conhecimentos anteriores sobre os maias. Em 2007, acreditava-se, por exemplo, que as maiores cidades maias tinham cerca de 60 mil habitantes e que aspectos como cidades muito populosas, arquitetura monumental e escrita surgiram apenas no chamado período clássico dessa civilização, entre os anos 300 e 900 da era atual (ver ‘Reis na floresta tropical?’, em CH 236).

Hoje, porém, os arqueólogos aceitam que algumas cidades maias eram bem maiores do que se pensava há alguns anos. Novos estudos indicam que existiam no território maia cidades com mais de 100 mil habitantes.

Isso é de grande importância porque, até agora, aceitava-se que a maior cidade da Mesoamérica (área cultural onde viveram os maias e povos como toltecas e astecas) teria sido Teotihuacán, construída provavelmente por um povo anterior a maias e astecas e situada perto de onde está hoje a Cidade do México.

Agora, pesquisas arqueológicas indicam que a população de cidades maias como Tikal e Calakmul se igualaria à de Teotihuacán. Além disso, estudos sobre outro período da civilização maia, o chamado pré-clássico tardio (do quarto século antes da era atual até meados do segundo século), na região denominada bacia do Mirador, no norte da Guatemala, onde foram construídas cidades importantes como El Mirador, Naachtun e Nakbé, levaram a conclusões surpreendentes.

A primeira é que várias características que antes se acreditava terem surgido somente no período clássico já estavam presentes antes, como a escrita, a arquitetura grandiosa e as amplas cidades.

Essas pesquisas revelaram, por exemplo, que a pirâmide mais alta de toda a Mesoamérica, e não apenas da área maia, ficava em El Mirador. Chamada de La Danta, tem mais de 70 m de altura, o que corresponde a um edifício de cerca de 24 andares.

Mais polêmica é a nova teoria segundo a qual os maias passaram por vários colapsos, e não apenas um. Um primeiro grande colapso teria ocorrido na região de El Mirador, no início da era cristã. Para alguns arqueólogos, os motivos desse colapso teriam sido os mesmos presentes no final do século 9: guerras e destruição ambiental.

O fim do mundo
Os maias ganharam destaque nos meios de comunicação, nos últimos meses, e o responsável por isso é seu calendário. O motivo do destaque é a afirmação de que os maias previram o fim do mundo para 2012. Mas isso é verdade?

A polêmica partiu de uma inscrição do chamado Monumento 6, pedra trabalhada encontrada nas ruínas da cidade maia de Tortuguero, no sul do México. Essa inscrição apresenta uma data relevante do calendário maia, interpretada como um anúncio do final dos tempos.

Na verdade, a data desse monumento indica somente o fim de um grande ciclo do calendário maia, e não a destruição do mundo
Cabe esclarecer que o calendário maia – um sistema complexo de calendários combinados – incluía diferentes ciclos. Na cultura desse povo não existiam lendas ou mitos sobre o fim do mundo. A interpretação recente é de responsabilidade não dos cientistas que estudam os maias, mas de escritores não especializados em cultura maia ou outras pessoas que – por erro ou deliberadamente – confundiram o fim do ciclo mais longo do calendário maia com o fim do mundo.

A ideia do fim do mundo está associada às tradições religiosas judaico-cristãs, que incluem episódios sobre essa questão: é o caso do ‘Livro do Apocalipse’, na Bíblia. O fato de muitas pessoas, na chamada civilização ocidental, acreditarem nessa ideia não significa que outras culturas, em outras regiões e em diferentes períodos da história, tivessem as mesmas concepções de criação e destruição do planeta.