Olho Vivo
por Carlos Artexes - da Equipe EMdiálogo
O texto publicado na Folha de São Paulo, em 29/11/2011, de João Batista Oliveira sobre os “Dilemas do Ensino Médio” mostra aparentemente um novo discurso para resolver os problemas do ensino médio. Diversificação! Será mesmo novo? Vejamos.
O ensino médio há algum tempo tem sido considerado o nível de ensino com maiores problemas seja de identidade, da quantidade do atendimento e da qualidade do ensino. Não faltaram nos últimos anos soluções conceituais para o ensino médio inclusive a retomada da falsa dicotomia entre profissionalizar e preparar bem para prosseguir os estudos (propedêutica). Na quantidade ocorreu uma grande expansão no ensino médio regular de 5 milhões de matrículas (período de 1991 a 2004); uma redução de 800 mil matriculas entre 2004 a 2007 (só São Paulo reduziu 300 mil matrículas) e uma estabilização no número de matrículas entre 2007 a 2011. O que não mudou foi a falta de uma oferta de qualidade para grande contingente da população. A Escola de ensino médio produziu uma inclusão excludente, pois não garantiu o real direito a educação apesar da conquista da ampliação do acesso as escolas.
A melhor chave de leitura para entender esta situação ainda é hoje a percepção da existência de dualismo estrutural no ensino médio em uma sociedade de classes, ou seja, uma sociedade que produz desigualdades sociais e utiliza das ofertas de propostas escolares diferenciadas para grupos sociais diferentes para manter e garantir a reprodução social. Não se questiona o ponto de partida da produção das desigualdades, mas propõe analisar soluções a partir das deficiências dos sujeitos (pessoas sem competências) no ponto de chegada no ensino médio. Na expansão quantitativa o dualismo estrutural oferecia uma formação profissional imediatista e aligeirada para os setores populares e uma "educação humanista" para continuidade dos estudos na educação superior de um pequeno grupo com situação social privilegiada. A expansão de matrículas no ensino médio mudou a realidade e produziu uma mudança estratégica. Hoje prevalece um dualismo invertido: uma educação tecnológica articulado com um ensino de qualidade para um pequeno grupo (longa trajetória de formação) e uma educação geral sem qualidade para os setores populares oferecido nas escolas públicas estaduais (curta trajetória de formação).
A lei de Diretrizes e Bases (LDB/96) deu um grande avanço ao considerar o ensino médio como educação básica e, portanto, uma exigência para todos viverem uma cidadania plena. Se levada a lei a sério isto obrigaria uma transformação social em vários níveis inclusive para espaços além do campo da educação. Mas passado 15 anos a realidade não se alterou no que se refere à exigência do compromisso de um ensino médio de qualidade para todos. Para um grupo de intelectuais (de uma vertente ideológica liberal) é mais fácil mudar a conversa e reconhecer que a lei é um equívoco do que considerar o ensino médio uma educação básica como direito de todos. Parte-se de uma realidade: as pessoas estão em patamares diferenciados de capacidades e conhecimentos e, portanto, deveriamos oferecer um ensino médio diferenciado e reduzido de acordo com a possibilidade de cada um. Um velho discurso com roupa nova, inclusive com o retorno da perspectiva salvadora da profissionalização.
Mas então o que fazer diante da realidade? Não há duvida de que é preciso repensar um novo currículo que busque garantir uma educação básica para todos e que também seja diversificada/flexível no sentido de estar sintonizada com a realidade de “situação” e “condição” juvenil e dos adultos que não tiveram este direito garantido. O ensino médio está prisioneiro da tradição escolar com um exagero de conteúdos que podem e deve ser questionados. É preciso definir o que é essencial e comum a ser garantido a todos e também redefinir a metodologia de ensino apropriada e centrada nos sujeitos e conhecimentos de uma sociedade contemporânea. Por fim, é preciso instituir uma concepção unificadora para todo e qualquer ensino médio enquanto etapa final da educação básica referenciada nas dimensões do trabalho, ciência, tecnologia e cultura.
A unidade não significa fazer o mesmo para todos, mas garantir uma formação integral sem o reducionismo proposto no texto do especialista.. Uma nova geração de políticas para o ensino médio poderiam inovar sem destituir os direitos de uma formação integral. Unificar no essencial e diversificar na complementação com ênfase no trabalho pela profissionalização ou ampliação na ciência, tecnologia e cultura.
E você o que acha? Olho Vivo!
Comments
Olá Artexes E a proposta do
Olá Artexes
E a proposta do ensino médio inovador nao é mudar essa realidade que acaba excluindo os setores populares de uma "educação humanista"?
ensino médio
Nilza
O Brasil tem uma grande divida em relação a garantia do direito a educação. De forma tardia democratizou o acesso. Atualmente a agenda é a garantia da qualidade educacional e não apenas o acesso. No ensino médio esta situação é mais grave. A proposta do Ensino Médio inovador realmente tem a "intenção" de valorizar a identidade e a garantia de uma educação de qualidade para todos.
Entao vamos continuar
Entao vamos continuar tentando também por aqui acompanhar e colaborar com esse projeto.
Comentário
Olá Carlos,
Somos alunos da disciplina Prática Escolar II do curso de Ciências Biológicas da UFJF, fizemos a leitura coletiva do seu texto e gostamos muito. Discutimos sua proposta e temos uma dúvida no último parágrafo: o que seria a "unificação do essencial" que deve ser trabalhada em qualquer ensino médio? E como você propõe a complementação do ensino médio que não é profissionalizante?
Abraços.
Pessoal de Minas
Pessoal de Minas (UFJF)
Desculpe o atraso na resposta. Vamos tentar iniciar o dialogo com as questões. O ensino médio é educação básica (prevista na LDB) e, portanto, etapa da formação humana fundamental e necessária a todos para inserir-se na sociedade de forma emancipada e critica. A unificação do essencial é garantir uma escola de formação integral (em todas as dimensões humanas) nesta etapa educacional em todo e qualquer ensino médio e, portanto, para todos. Não se trata de conteúdos unificados ou mesmo de objetivos comuns, mas de uma perspectiva formativa democrática e inclusiva (no seu sentido mais amplo) que confronta com a concepção de uma escola a serviço da reprodução das desigualdades educacionais e sociais.
Quanto a questão da complementação: considerando os eixos estruturantes (Trabalho, Ciência, Tecnologia e Cultura) da identidade do currículo do ensino médio (aprovado nas novas DCN de 2012) o ensino médio pode e deve ter formas diversificadas de organização sem perder sua caracteristica de educação básica para todos. Temos defendido que a profissionalização no ensino médio é uma das possibilidades de organização desta etapa (Ensino médio integrado a educação profissional). Neste caso estamos valorizando o trabalho na sua dimensão histórica (emprego e inserção no trabalho produtivo). Entretanto o ensino médio poderia ter também uma complementação na ciêcnia e tecnologia (inicação cientifica e tecnológica) e na Cultura (valorização das artes).