Professora de História sonha em dar menos aulas

 Daniele Monteiro/EMdiálogo O sonho de Fátima, que pode parecer bobagem para quem não vivencia o dia-a-dia da escola mas é coisa muito séria para quem leciona, é poder dar aulas e para apenas cinco turmas. Atualmente a professora trabalha em duas escolas (uma pública e uma particular), tendo que atender a demanda de 13 turmas.

 

O dilema vivido pela professora é muito comum entre aqueles que dão aulas em escolas públicas. O salário recebido com uma matrícula não oferece condições necessárias para que ela crie seus dois filhos, porém, trabalhando em mais de uma escola, ela diz sentir-se mal por não poder ser tão atenciosa quanto gostaria. “Eu fico com a consciência um pouco pesada por não ser uma boa professora, que tem tempo para se dedicar.” desabafa.

Como uma das tentativas de “recompensar” seus alunos pela dedicação que ela julga pouca, Fátima organiza passeios para levar seus alunos de São Gonçalo para o Rio de Janeiro, onde frequentam museus, teatros e outros espaços culturais. A professora explica seu projeto de vida: “Eu quero que saiam da escola pública sabendo que têm direito a entrar numa sala de museu, que eles têm o direito de ver obras grandiosas.”

O dinheiro para as excursões é arrecadado entre os próprios alunos, porém a professora diz que, sozinhos, eles não se sentem à vontade para entrar nos espaços voltados para a cultura. “Meus alunos precisam de mim para isso, eles têm medo de entrar, medo das portas fechadas.” conta.

Fátima se sente culpada por ministrar muitas aulas para garantir o salário

A cada ano Fátima faz um álbum com as fotografias tiradas durante as excursões que organizou. Com isso ela pretende historiar sua trajetória como professora, que já dura 17 anos. Para ela, a maior dificuldade de se trabalhar este tipo de atividade com o Ensino Médio, além da falta de verbas, é o vestibular, que impede que o professor se aprofunde muito, pois ele é obrigado a passar todo o conteúdo requerido nas provas de vestibular.

Comments

imagem de fabio Lennon Marchon dos Santos

Apoio à companheira

Conheço Fáima, trabalho com ela e meu comentário não pode e não deve ser imparcial.

Excelente pessoa, ótima professora e, acima de tudo, engajada nas questões culturais e sociais ela tenta mostrar aos alunos o mundo à sua volta e, assim, tenta transpor os limites do muro da escola.

A realidade dessa companheira de trabalho não difere da realidade de outros tantos profissionais. A tendência atual  é reduzir a carga horária das disciplinas para que o professor esteja em mais salas, ampliar as horas na escola para que os alunos passem mais tempo na escola, aumentar o quantitativo de alunos por sala  (lotando as salas de aula) para maximizar os espaços.

Dentro deste contexto, a estagnação dos salários é uma constante. Exige-se formação, qualificação, empenho, dedicação, esforço, comprometimento...isso tudo deve ser buscado pelos profissionais, muitas vezes, por conta própria arcando com suas despesas e com seu baixo salário. Este aspecto, fruto de uma política neoliberal, ainda presente em nossa sociedade, nos conduz a um quadro contraditório.

O professor tenta sobreviver e cuidar da família se desdobrando em "mil escolas", ao mesmo tempo tenta encontrar tempo para se qualificar, tenta ainda encontrar recursos que garantam tal qualificação e, mesmo que consiga, o retorno não ocorre. Talvez uma pequena gratificação, muitas vezes nem isso.

É por isso que, dentro do possível e do impossível, Fátima é uma vencedora, um exemplo, uma companheira de trabalho excepcional.

Por enquanto isto basta....

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imagem de Carlos Henrique dos Santos Martins

emoção e luta

Assim como a professora Fatima, conheço muitos outros profissionais comprometidos com a educação de qualidade ainda que o poder público nos empurre para o abandono e para o descrédito da profssão. Afinal, como fazer tudo isso que ela propõe por míseros 580 reais? (mas o piso nacional não são 950 reais? Quem regula isso? O que acontece com quem não cumpre?). Quem quer estudar tanto para ganhar nada? A lógica da gestão empresarial implantada por governos que confundem (??) educação com mercadoria e igualam o fazer pedagógico à lógica da produtividade transforma alunos em peças baratas produzidas em série para servirem de reposição na mautençao da engrenagem que sustenta a lógica da pobreza e da miséria. Ainda assim, existem fatimas aos milhares por esse Brasil de meu Deus.

Há o outro lado da moeda. Vários professores (ou seriam dublês de profesores, de educadores?) que realizaram o sonho de Fatima, ou seja, trabalham em apenas uma escola, com carga horária compatível e salário condizente. Entretanto, pouco ou nada produzem. Alguns ainda reclamam que 14 ou 16 tempos é coisa demais. Se ainda ocupassem seu tempo complementar com atividades acadêmicas que resultassem em maior proveito para a comunidade, melhor formação discente, mas, nem isso....Quanto menos fizerem melhor será. Resta saber para quem.

 

 

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