Justiça interdita parcialmente o "Complexo do Pomeri", em Cuiabá

A juíza Gleide Bispo Santos, da Primeira Vara Especializada da Infância e Juventude de Cuiabá, decretou, em decisão de mérito, parcialmente interditado o Centro Socioeducativo de Cuiabá (Complexo do Pomeri), ressaltando que a interdição não atinge os atos infracionais análogos aos delitos de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, e terrorismo (artigos 1º e 2º da Lei nº 8.072/90). A magistrada julgou procedente os pedidos feitos pelo Ministério Público Estadual e confirmou antecipação de tutela já deferida em desfavor do Estado de Mato Grosso (exceto no tocante à multa previamente aplicada), reconhecendo o descumprimento, por parte do Estado, da referida liminar.

“Por ocasião da apreciação da antecipação de tutela, restou consignado que não se ignora que a realização dos direitos econômicos, sociais e culturais depende do vínculo financeiro subordinado as possibilidades orçamentárias do Estado, porém, o Estado de Mato Grosso, ao que parece, não enfrenta problemas financeiros, pois está gastando fortunas com a ‘Copa do Mundo’, escolha política discricionária e, para tanto se propôs a instalar transporte bilionário (VLT) – que sequer será utilizado pelos visitantes, construir arena de futebol onde serão realizados apenas quatro jogos, enfim, este não é o cenário de um Estado que não pode investir em Centros Socioeducativos para recuperar seus adolescentes vítimas da própria ineficácia estatal”, salienta a magistrada em trecho da decisão.

A partir da intimação desta sentença, o Estado, por meio da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), deverá se abster de permitir o ingresso de qualquer adolescente oriundo de outras comarcas no Centro Socioeducativo, até mesmo os de Várzea Grande, envolvendo a prática de todo e qualquer ato infracional, inclusive aos análogos aos delitos previstos na Lei 8.072/90. Também deve iniciar a construção de unidades de internação masculina provisória e definitiva com capacidade para 60 adolescentes cada, no prazo máximo de 90 dias, nas cidades de Barra do Garças e Sinop, de modo que absorvam a demanda local e assegurem ao menor o direito de permanecer próximo ao domicílio de sua família.

A juíza fixou prazo improrrogável de 48 horas, também contados a partir da intimação, para que o Estado promova a remoção dos adolescentes internos no bloco antigo (ala de internação definitiva) do Centro Socioeducativo para local adequado e higienizado. Estabeleceu prazo de 10 dias para que seja iniciada a demolição desse bloco, considerado insalubre, e de 15 dias para que sejam iniciadas as obras de reforma do bloco de internação provisória, de saúde e do bloco 1 de internação definitiva. O prazo de conclusão da reforma é de no máximo quatro meses.

No prazo de 30 dias os adolescentes que cumprem medida de internação devem ser separados segundo os critérios de idade, compleição física, gravidade da infração e tempo de cumprimento da medida, conforme dispõe o artigo 123 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Nesse mesmo período deverá implantar projetos de reinserção social para os internos e prover o local com uma unidade destinada ao tratamento contra a dependência química. Em 10 dias deverá comprovar o saneamento das irregularidades apontadas pelo Conselho Regional de Nutrição praticadas pela marmitaria que serve os adolescentes. Além disso, os menores da unidade de internação provisória e do Bloco 1 da unidade de internação definitiva devem fazer todas as refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar) no refeitório.

Conforme a magistrada, a unidade de internação masculina do Centro Socioeducativo está em colapso há vários anos, e esta realidade é de conhecimento geral, mas mesmo assim o Estado de Mato Grosso não foi capaz de sanar os problemas que violam os direitos mais elementares dos internos. “Os veículos de comunicação divulgaram nos últimos anos a ocorrência de várias rebeliões nas referida unidade de internação, das quais resultaram, homicídios, torturas, lesão corporal, dentre outros ilícitos. Entretanto, apesar das vidas que se perderam, e das famílias que foram destruídas, a administração pública, até o momento impune, talvez seja por isso, permaneceu inerte e não adotou medidas verdadeiramente eficazes para solucionar o problema”, enfatiza.

O Estado de Mato Grosso também deve adquirir continuamente materiais de limpeza em quantidade que garanta a higiene das celas e de todo o Centro, bem como material para realização de procedimentos odontológicos e médicos, colchões, uniformes, lâmpadas, material de higiene pessoal para todos os internos, ou seja, todo tipo de material básico e essencial à manutenção das atividades do Centro. Precisa ainda prover a unidade de equipe multidisciplinar (médicos clínicos, psiquiatra, odontólogos, psicólogos, assistentes sociais, professores, agentes orientadores e demais profissionais) em número suficiente à demanda, assim como de mobiliário, utensílios, equipamentos de educação e recreação, de informática, insumos de escritório, bem como de outros itens necessários ao adequado funcionamento da atividade fim e administrativa da referida unidade.

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