As identidades em contato com a poesia

 

     Durante o meu período de estágio, percebi que os alunos tinham alguma dificuldade para ler poesia. Estagiei em duas turmas do ensino médio de um colégio estadual no município de Niterói, e, entre os problemas enfrentados por eles nas aulas de Literatura, o mais grave talvez tenha sido não ter havido pelo menos uma aula de leitura de poesia. Aula esta que ensinasse a ler e compreender que os versos e as estrofes têm significado importante para o entendimento do poema. Numa das aulas, pedi para ler em voz alta um poema transcrito no livro didático, e após os aplausos, entendi que a falta de entendimento se dava pelo não saber implícito à leitura de textos líricos. A leitura em voz alta fez os alunos entenderem a poesia como um todo e não um conjunto de frases.

     A literatura é um “grafo complexo de pegadas como prática: prática de escrever”(BARTHES, 1978) , como disse Barthes em "Aula", por isso, era necessário que os alunos tivesse contato com poesia e que, para facilitar, ela não fosse numa linguagem complexa, tal qual as poesias barrocas estudadas naquele semestre. Por isso, no projeto de Pesquisa e Prática de Ensino, achei prudente levar algo que eles pudessem compreender bem, tanto pela linguagem quanto pelo tema. Desta maneira, a decisão foi por um poema de Carlos Drummond de Andrade; Poema de sete faces, que abre o livro "Alguma poesia" de 1930.  Este poema trabalha com imagens e movimento em confronto com o sujeito poético que se encontra estático. Um ato cotidiano como entrar num ônibus e notar a presença das outras pessoas.

     Já o tema e os objetivos foram moldados pensando no ponto de vista social que aquela poesia poderia trazer para a discussão. Pensando no Tema Transversal Pluralidades Culturais, proposto pelo governo, a ideia era discutir essas pernas que entravam pelo bonde: “O bonde passa cheio de pernas:/ pernas brancas pretas amarelas./ Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração./ Porém meus olhos/ não perguntam nada.”(ANDRADE, 1976)  e que iam povoando a mente do sujeito poético, formando uma multiplicidade de ideias e de arquétipos.  É interessante ressaltar como isso poderia pertencer também ao cotidiano dos alunos. Como eles se definiriam e definiriam os outros se estivessem na mesma situação? Como a identidade deste homem poderia ser definida pelo seu semblante sério e pelas suas elucubrações acerca daquele movimento cotidiano dentro de um bonde?

     Por isso, o projeto tratava de identidades culturais e como cada um dos alunos poderia tanto pertencer àquela massa que passava pelo bonde, quanto poderia ser um observador atento àquelas pessoas. As sete faces do poema são as faces que o sujeito poético poderia assumir dentro das cenas propostas nas estrofes, uma tentativa de conhecer a si mesmo. Nesta tentativa, como atividade, pediria que os alunos escrevessem seus próprios poemas em que aparecessem quantas faces fossem necessárias para poder definir a si mesmos. 

 

Juliana Jordão Canella Valentim, projeto Drummond e as sete faces na escola.

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Comments

imagem de Nilma Gonçalves Lacerda

Sete faces e tantas mais

Bom projeto, Juliana, lembrando ainda que valerá bem a pena buscar na poesia outras tantas faces, a exmplo daquelas que o poeta revelou. 

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Sete faces e tantas mais

Bom projeto, Juliana, lembrando ainda que valerá bem a pena buscar na poesia outras tantas faces, a exmplo daquelas que o poeta revelou. 

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