Os jovens e a perspectiva de escola, trabalho e futuro.
Assim como ocorreram mudanças nas formas de aplicação e fornecimento de ensino ao longo dos anos, as mudanças que a nossa sociedade sofreu reflete-se também nas mudanças de características de quem frequenta a escola. Os nossos jovens, que são nossos alunos no Ensino Médio, são diferentes em vários aspectos daqueles que freqüentavam os bancos escolares nas gerações passadas.
Esses jovens são frutos de outros costumes, de outra forma de criação e a educação que recebem em casa diverge muito do que seria considerado ideal para o desenvolvimento pleno de um cidadão correto e preocupado com a sociedade. Ao longo dos anos fomos assistindo o desenvolvimento de diversas tecnologias, e a cada geração eles estão mais inseridos em uma sociedade cada vez mais virtual, onde a velocidade predomina, onde a pressa é comum, onde as informações são processadas instantaneamente. Como ter paciência de ficar sentado, assistindo uma aula em que ainda predominam metodologias de séculos passados? Como prestar atenção em fala de professor se as informações estão disponíveis na internet?
E os professores estão limitados pela falta de investimentos e recursos, como tornar-se atrativo como educador, para uma geração que está acostumada com uma diversidade de aparelhos que consideram mais atrativos? Enquanto esses jovens estão familiarizados com a instantaneidade, e os professores, na sua maioria, são de outra época, de outros costumes e valores.
A partir disso, encontramos o que considero um dos principais obstáculos da plena aprendizagem dos conteúdos pelos nossos jovens, a disparidade entre a forma que ensinamos e a forma que eles querem aprender.
Na medida do possível, tentamos amenizar esses problemas, inserindo metodologias diversificadas no processo de ensino-aprendizagem, para tornar o conteúdo mais atrativo, e também aproximar os conteúdos escolares com a realidade em que vivem. No entanto, muito precisa ser conquistado para que o nível entre realidade social e acesso a tecnologia sejam menos desiguais entre escola e aluno.
Recebemos alunos de diferentes níveis econômicos e diferentes bagagens culturais, e muitas vezes essa disparidade fica evidente em sala de aula, onde alguns tem maior facilidade de apreensão dos conteúdos científicos e de relacioná-los com os conhecimentos empíricos adquiridos com a sua vivência.
Infelizmente não somos capazes de eliminar todas as barreiras e dificuldades de aprendizagem dos alunos, associando à nossa dificuldade de ensinar, o desinteresse que muitos apresentam. É uma pena que muitos de nossos alunos não valorizem a oportunidade que possuem, em terem escolas gratuitas (queria poder dizer também: de qualidade) acessíveis, independente da classe econômica. Visto que em anos anteriores, a escola era apenas um sonho difícil de ser alcançado, para aqueles que não pertenciam as classes privilegiadas na sociedade.
E não pensam na escola como uma possibilidade de melhorarem suas vidas, não apenas quando falamos em profissões e salários, mas também no conhecimento crítico, que este sim pode torná-los cidadãos que lutam por seus direitos.
A escola está atrasada, defasada em relação ao avanços que verificamos em outros campos da sociedade e economia. Enquanto existe um desenvolvimento tecnológico sem freios, em que os fluxos de pessoas, mercadorias e informações estão em velocidades instantâneas, acelerando todos os processos por meio do desenvolvimento dos sistemas de transportes e informações, enquanto as instituições escolares estão excluídas dessa modernização.
Os nossos jovens são familiarizados com a diversidade cultural, também provocada pela globalização, e possuem identidades culturais próprias do momento em que vivem e do contexto em que são criados. A globalização rompe fronteiras ao longo dos anos e aproxima no sentido temporal diferentes regiões do globo. Espero que a globalização possa também romper com as fronteiras do preconceito e desigualdades sociais. Fatores que ainda prejudicam vários de nossos jovens, que são rotulados, e que os afastam dos bancos escolares, principalmente no Ensino Médio.
Quando questiono meus alunos sobre as perspectivas que possuem sobre o seu futuro, recebo diversas respostas, a grande maioria conta dos seus sonhos em ter boas profissões, serem advogados, médicos, dentistas, engenheiros...entre outras profissões que são estimadas na sociedade e possuem remunerações altas. Eles querem ter uma vida boa, comprar bens, constituir família. Mostram-se cheios de sonhos e expectativas, mesmo os que ainda não decidiram ao certo, e aqueles que possuem dúvidas muitas vezes perguntam sugestões. É revigorante saber que apesar de não demonstrarem muito interesse em alguns conteúdos trabalhados nas aulas, eles preocupam-se com o que querem para suas vidas.
No entanto, existem aqueles que não expressam desejo algum, como o caso de um aluno que me respondeu que não queria trabalhar, não faz diferença se é aprovado ou reprovado e que não importava o que teria que fazer no futuro. Fiquei tomada por um sentimento de decepção e impotência, mas fiz uma fala sobre a sociedade que criticamos e a que queremos ter relacionando com as expectativas deles. São esses jovens que serão nossos cidadãos, os profissionais e exercerão cargos políticos. Está nas mãos deles as melhorias que almejamos. Mas que sociedade eles conduzirão?
Muitos são os casos de alunos que possuem famílias desestruturadas, que não recebem incentivos ou amparo. São negligenciados devido às condições sociais e preconceitos. Muitos têm pressa em tornarem-se adultos, libertarem-se das obrigações escolares e de obedecer a regras, mal sabem que as obrigações serão cada vez maiores.
No caso dos alunos que freqüentam o Ensino Médio diurno, no qual leciono, são poucos os que trabalham e o fazem em meio período, geralmente são cargos de ajudantes no comércio, alguns no estabelecimento dos próprios pais. Mas sabemos que no período noturno existe uma concentração de alunos que trabalham o dia inteiro e a noite freqüenta os bancos escolares. Apresentam um perfil diferenciado dos estudantes do diurno, os quais alegam que trabalhar em meio período não atrapalha o desempenho escolar, mas os do noturno chegam cansados e muitas vezes desanimados. A grande maioria dos alunos aponta ter consciência da importância da escola e do aprendizado que ela transmite em suas vidas, mas ainda falta na prática cotidiana o interesse para alcançarem os frutos do esforço. Sabem que a educação pode mudar o futuro deles, enquanto cidadãos e profissionais, mas a indisciplina e desinteresse são grandes empecilhos.
Alguns alunos que são extremamente desinteressados e indisciplinados em sala de aula, quando são vistos no trabalho apresentam comportamento totalmente diferente. Qual a importância que dão para o trabalho e para a educação? Valorizam mais o trabalho porque recebem salário e não vêem recompensa na escola? Mas e o futuro? Pretendem realizar a mesma função de ajudantes e salários mínimos pelo restante de suas vidas?
Quando pensamos em quais penalidades eles temem mais, verifica-se o imediatismo, ser chamada a atenção no trabalho e o medo da demissão tem conseqüências que os afetam no momento atual, enquanto que o medo da reprovação não é tão visível neles. Pior ainda, que não pensam que mais importante que passar de ano é o conhecimento que podem adquirir, e isto lhes rende um futuro melhor.
O mundo do trabalho é apresentado aos estudantes das escolas públicas muito cedo, pois a maioria deles tem necessidades econômicas imediatas, e precisam ajudar na renda familiar. Por um lado resulta em amadurecimento, por outro, desvia do que deveria ser a prioridade para nossos jovens: os estudos.
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