Organização e Gestão Democrática da Escola - Etapa I - Caderno V
CEAD CEEBJA Poty Lazzarotto
Orientadora de Estudos e Professores Cursistas
Reflexão e Ação - Caderno V
Gestão Democrática
O Caderno V do Pacto Nacional pelo fortalecimento do Ensino Médio trata da organização e gestão democrática da escola, mais especificamente da escola pública, com os seguintes tópicos:
• Gestão democrática da educação e gestão democrática da escola;
• A direção da escola e a gestão democrática;
• O conselho escolar e a gestão democrática;
• O grêmio estudantil e a gestão democrática;
• Os desafios da prática: A gestão democrática da escola pública entre o proposto e o realizado;
• A gestão do trabalho pedagógico: O PPP em ação.
A Constituição Federal de 1988 já traz a ideia da gestão democrática do ensino público no Art. 206, Inciso VI, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/LDB 9.394/96, coloca como um de seus princípios no Art. 3º, Inciso VIII, e Art.14, Incisos I e II, da seguinte forma:
Art. 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;
Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
A palavra gestão também é tomada como sinônimo de administração e, esta, segundo PARO (1998), é entendida como a “utilização racional de recursos para a realização de determinados fins”. Os recursos podem ser físicos, financeiros, humanos, pedagógicos, metodológicos, etc. Mas, em educação, quais seriam os fins? A resposta seria: educação de qualidade que, ao ser entendida
“(...) como a apropriação do saber historicamente produzido é prática social que consiste na própria atualização cultural e histórica do homem. Este, na produção material de sua existência, na construção de sua história, produz conhecimentos, técnicas, valores, comportamentos, atitudes, tudo enfim que configura o saber historicamente produzido. Para que isso não se perca, para que a humanidade não tenha que reinventar tudo a cada nova geração, fato que a condenaria a permanecer na mais primitiva situação, é preciso que o saber esteja sendo permanentemente passado para as gerações subsequentes. Essa mediação é realizada pela educação, do que decorre sua centralidade enquanto condição imprescindível da própria realização histórica do homem.” (PARO, 1998).
Porém, a administração, ou gestão, não pode ser concebida, como diz PARO, como um fim, em si mesma, mas como um meio de se alcançar um objetivo, que na escola pública, como em qualquer outra, é o ensino e a aprendizagem.
O conceito de gestão democrática ou gestão participativa parte do princípio de que a comunidade escolar - professores, pedagogos, pais, alunos, direção, funcionários, comunidade do entorno - se envolve com a instituição da escola tendo como finalidade tomar decisões em conjunto, com vistas à melhoria do processo pedagógico (NASCIMENTO, 2010). Para Heloisa Lück (2002, apud NASCIMENTO, 2010) significa ainda o trabalho associado de pessoas analisando situações, decidindo sobre seu encaminhamento e agindo sobre elas em conjunto.
A necessidade da gestão democrática na escola é defendida por vários autores em cujos escritos apresentam as virtudes e possíveis consequências do processo. Mesmo sendo essa uma necessidade da escola, a transposição dos postulados da teoria para a prática, não é tarefa fácil. A participação de todos os componentes da comunidade escolar é dificultada por fatores muito variados: tempo disponível a ser dedicado, perfil adequado dos profissionais envolvidos, envolvimento nas questões ou interesse pelos resultados.
O tempo que as pessoas dispõem para dedicar-se a tais questões é um fator importante a ser considerado. Os profissionais da escola estão assoberbados com as exigências burocráticas de suas funções, sejam eles professores, pedagogos, diretores ou funcionários. Os professores, mesmo dispondo da hora-atividade, geralmente trabalham em mais de uma escola, o que duplica o tempo gasto com as atividades extraclasse consumindo as horas livres que deveriam ser dedicadas ao lazer ou à família. O mesmo pode-se dizer dos pais ou dos alunos adultos (de EJA, por exemplo), cujo tempo destinado ao trabalho e ao translado chega a consumir uma parte tão significativa do seu dia que quase não sobra tempo sequer para descansar ou ficar com a família, quanto mais para participar dos assuntos da escola.
Outro aspecto, talvez limitado pelo anterior, mas não só isso, a ser considerado é o envolvimento das pessoas, sejam pais, alunos, professores ou outros profissionais da escola. O próprio Caderno V, p.36, citando PARO, coloca que o condicionante sócio-econômico, além do cultural e do institucional, é um dos limitadores dessa desejada participação, uma vez que as pessoas antes precisam atender suas necessidades materiais para depois conseguir disposição pessoal e de tempo para participar. Quanto ao condicionante cultural, ainda seguindo o autor citado no referido caderno, a dificuldade em participar se estabelece pelo constrangimento que os pais sentem por não possuir conhecimento das questões pedagógicas. Quanto ao condicionante institucional, é fato que não há entre a maioria de nós brasileiros o hábito da participação em associações de representação coletiva que exercitam a prática dialógica, ou seja, discussão, troca de ideias, consenso, etc., o que facilitaria a prática da participação democrática nas escolas.
A gestão democrática na escola não acontece se as pessoas não têm o perfil adequado para tal exigência e este perfil seria o da liderança participativa, cujo objetivo, segundo (NASCIMENTO, 2010, p.31) é a “(...) integração no ambiente de trabalho”, de modo a evitar a “(...) redução de conflitos entre os colaboradores, aumentando assim a auto-estima, confiabilidade e credibilidade.” Das lideranças da escola se espera que estejam abertas ao diálogo e que as questões colocadas por qualquer um dos membros da comunidade escolar, sejam discutidas e deliberada e depois colocadas em prática. Dos demais envolvidos espera-se o diálogo, a tolerância com o divergente, o comprometimento com o que foi acordado e o conhecimento dos seus direitos e deveres, da sua função, dos demais participantes da comunidade escolar e da função da escola.
Nas escolas percebemos níveis variados de participação democrática. Em algumas, as decisões importantes são tomadas de acordo com a anuência dos órgãos colegiados, como o Conselho Escolar, a Associação de Pais e Mestres ou mesmo o grupo de professores. Em outras, a equipe diretiva toma as decisões isoladamente e até arbitrariamente. Isso significa que não basta a gestão democrática estar garantida na legislação, é necessário a sua efetivação pelas pessoas que compõem a escola. Mas, se a escola conseguisse se organizar de modo a obter a participação de todos os seus elementos para que as questões fossem discutidas e deliberadas em conjunto, essa prática adiantaria se os sistemas de ensino não se mostrassem tão autoritários em suas decisões, que, quando recebidas pela escola, já vêm com a chancela do “cumpra-se!”? Como ter uma prática democrática se o autoritarismo “vem de cima”? A autonomia da escola, então, é relativa. Ela pode decidir sobre a gestão dos recursos financeiros – dentro dos limites impostos pela legislação, é claro - mas não pode deliberar sobre questões tomadas nas esferas superiores. Um exemplo é este curso de formação de professores do qual o presente artigo é uma das atividades exigidas. De que adianta discutirmos a gestão democrática proposta nos cadernos, se as decisões quanto à organização curricular em áreas de conhecimento já foram tomadas pelo MEC e colaboradores das universidades federais envolvidas. Como são decisões já tomadas, de que forma as discussões dos grupos de professores em formação poderão ser aproveitadas como contribuição para o Pacto Nacional de Fortalecimento do Ensino Médio? Pelo visto, não haverá nenhum aproveitamento.
Sabendo da relativa autonomia da escola e que muitas das suas ações já estão determinadas pela legislação ou pelas normativas dos sistemas de educação, resta para a escola discutir e decidir sobre como quer se constituir. O caminho para isso é o Projeto Político Pedagógico. Nele, a escola pode definir um rumo a tomar, uma direção a seguir no que tange ao trabalho pedagógico em dois níveis, segundo VEIGA (1998): como organização da escola como um todo e como organização da sala de aula. O Projeto Político Pedagógico, ao mesmo tempo em que resgata a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva, exige dos educadores, funcionários, alunos e pais a definição clara da concepção de ensino que desejam, do tipo de escola que intentam e de cidadão que querem formar. No PPP são especificados os meios e ações necessários para se atingir tais fins, ou seja, a educação de qualidade.
REFERÊNCIAS
CURY, Carlos Roberto Jamil, A gestão democrática na escola e o direito à educação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 2007. Disponível em: <http://www.seer.ufrgs.br/rbpae/article/viewFile/19144/11145> acesso em 23/11/14.
NASCIMENTO, Maria de Lourdes. Gestão democrática nas escolas públicas. Monografia, Universidade Candido Mendes, Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://www.avm.edu.br/docpdf/monografias_publicadas/k215969.pdf> acesso em 24/11/12.
PARO, Vitor H. A gestão da educação ante as exigências de qualidade e produtividade da escola pública (Trabalho apresentado no V Seminário Internacional Sobre Reestruturação Curricular, realizado de 6 a 11/7/1998, em Porto Alegre, RS. Publicado em: SILVA, Luiz Heron da; org. A escola cidadã no contexto da globalização. Petrópolis, Vozes, 1998. p. 300-307) disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/sem_pedagogica/fev_2010/a_gestao_da_educacao_vitor_Paro.pdf> acesso em 16/11/14.
VEIGA, Ilma Passos da. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção coletiva. In: VEIGA, Ilma Passos da (org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. Campinas: Papirus, 1998.p.11-35. Disponível em: < https://www.google.com.br/?gfe_rd=cr&ei=l_t1VPSYJoSj8wfCvoCQBg&gws_rd=ss...
<http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf> acesso em 16/11/14.
<http://www.jusbrasil.com.br/topicos/1241734/artigo-205-da-constituicao-federal-de-1988> acesso em 24/11/14.
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