O que seria a Educação Integral
Material base para discussão de Educação Integral e Educação em tempo integral:
A proposta de implementação de escola em tempo integral esteve e tem estado nos planos de governo de quase todos os candidatos, seja na política majoritária ou não. Ocorre que, ao se tomar as falas dos vários candidatos, uma carga de assistencialismo acompanha os motivos pelos quais se defende a ampliação da jornada de estudos dos nossos alunos da escola pública. Isto significa que ao se conceber a escola em tempo integral, como bandeira que figura os discursos políticos, parte dos argumentos redundam em privações econômicas e sociais voltadas a “tirar os jovens e crianças das ruas”. É certo que a própria história da escola integral acusa este caráter compensatório; contudo, se tomarmos na sua gênese, a análise possível de ser feita é de um conteúdo essencialmente político e pedagógico que denota, para além da concepção da escola em
tempo integral, uma concepção de educação integral.
Afinal, a educação integral implica na educação em tempo integral? Seria possível termos uma escola em tempo integral sem uma concepção de educação integral?
Em que medida uma escola de tempo integral pode ir para além do contraturno, no que um e outro diferem? É possível conceber a educação integral sem a ampliação da carga horária? Existe diferença entre escola em tempo integral e aluno em tempo integral? Qual a compreensão se tem do papel da integração curricular? Quais as expectativas de pais e professores acerca do papel da escola em tempo integral? Enfim, qual o papel da comunidade e das políticas públicas? Em que medida também podemos dizer que a proposta do governo federal intitulada “Mais Educação” se caracteriza numa concepção de educação integral, de escola em tempo integral ou pode incorrer em mais uma política de contraturno?
A HISTÓRIA E A POLÍTICA NA PERSPECTIVA DA (NÃO) INTEGRALIDADE
As políticas educacionais no Brasil, em geral as que foram definidas na década de 1980 e 1990, marcaram a história da educação brasileira com programas de extensão da jornada escolar. Na experiência brasileira, segundo Saviani (1987), acabaram se constituindo em políticas “pobres para os pobres”. Isto significa dizer que, em nome de retirar as crianças das ruas ou mesmo lhes oferecer, a partir da escola, um atendimento às suas necessidades básicas, o fazem em detrimento da escolarização necessária para sua formação humana.
A educação pode ser concebida como integral na medida em que, a partir da escola, o sujeito histórico ao mesmo tempo em que cria, se apropria do que foi criado por ele e pelo conjunto dos homens na sua condição histórica.
Assim, ela não se constitui em treinamento - seja na perspectiva do trabalho mental ou físico. A educação integral é em si humanizadora. Isto pressupõe também oferecer possibilidades para que, a partir dela, o sujeito se aproprie da cultura, da arte, da história e do próprio conhecimento, tomado este de forma diversificada, teoricizada, praticada, vivida e experienciada. Antes de se pensar em estender o tempo da escola, é preciso, portanto, situar que não somente a escola é de tempo integral, mas trata-se de uma educação integral. Recorrendo a Moraes (2009, p.21), tem–se que a
“Educação integral forma
pessoas íntegras”. Integral significa inteiro, completo, total. Em latim, integrum significa íntegro, sincero, são, puro, não corrupto, sóbrio, sem senão.
Esta concepção se configura numa formação para a politecnia, o que corresponde a uma formação por inteiro, numa união indissolúvel entre arte, literatura, ciência, prática, teoria, trabalho e estudo. Portanto, a formação politécnica e a educação integral encontram na pedagogia do trabalho e na filosofia o seu maior fundamento. (CODELLO, apud MORAES, 2009, p.26).
Em suma, a concepção de educação integral, tomada em sua essência, é emancipadora, libertadora e humanizadora, na medida em que não separa o fazer do pensar ou mesmo a atividade física da intelectual.
Porém na maioria das políticas que temos hoje, o critério de adoção do Programa nas escolas públicas visa atender, em especial, Estudantes que estão em situações de risco, vulnerabilidade social e sem assistência; estudantes em defasagem série/idade; estudantes das séries finais da 1ª fase do ensino fundamental (4º / 5º anos), nas quais há uma maior evasão na transição para a 2ª fase; estudantes das séries finais da 2ª fase do ensino fundamental (8 e/ou 9 anos), nas quais há um alto índice de abandono; estudantes de séries onde são detectados índices de evasão e/ou repetência. (MEC, 2008)
Ocorre, contudo, que os Programas, ao pressuporem atividades e oficinas em tempos e atendimentos próprios, não expressam em sua totalidade a integração com o currículo escolar. Em alguma medida, acaba se convertendo num projeto de contraturno que pode correr o risco de assumir um viés assistencialista pela demanda a que se destina atender e pela insuficiência na integração das atividades ao currículo escolar.
Este caminho expressa, sobretudo, um projeto pedagógico, o qual, por sua vez, revela um Projeto social. Isto significa dizer que o currículo não pode ser concebido como um rol de disciplinas organizadas de forma linear no tempo já culturalmente definido em função de horas-aula.
Para falar realmente em educação integral, que forma o homem íntegro, o currículo deve ser integrado, por sua vez, se caracteriza exatamente pela integração de todas as potencialidades da condição humana.
A omnilateralidade não é o desenvolvimento de potencialidades humanas inatas. É a criação dessas potencialidades pelo próprio homem, na prática social, no “Mundo do Trabalho”. Não se trata, portanto, de oferecer um tempo de disciplinas acadêmicas ou formais e outro de oficinas e atividades lúdicas, que geralmente se consubstanciam em trabalhos manuais e artísticos.
Ocorre que essa formação, posta na relação educação e trabalho pode ser, de fato, insuficiente em quatro horas de aula. Isto implica em dizer que a educação em si deve ser integral, mas a extensão do tempo lhe possibilita uma forma mais articulada, ou melhor integrada, haja vista a concepção de currículo em que se defende a relação tempo - espaço,
produção-fruição, conhecimento-trabalho, prática–teoria, pensar–fazer e corpo-mente.
Portanto, é importante destacar que antes do tempo ser estendido, o aluno é integral. Ele deve estar essencialmente envolvido em atividades absolutamente integradas ao currículo, que lhe permita a formação humana plena, ou seja, numa dimensão “omnilateral”.
A integralidade é tomada aqui como possibilidade de desenvolvimento dos aspectos afetivo, cognitivo, físico e social, sem hierarquias. Não existe, neste sentido, uma relação de maior ou menor importância sobre as atividades que se propõem e dos conhecimentos que se ensinam. A extensão do tempo escolar diário permite que se vislumbre o reconhecimento da pessoa como um todo - e não como um ser fragmentado entre corpo e intelecto - em atividades que envolvam a multiplicidade de aspectos parabenefício do desenvolvimento - tempo para adquirir hábitos, valores, conhecimentos. Neste sentido, há dois destaques ainda a serem feitos: o papel do projeto da escola
e o papel da comunidade escolar.
Diante dessa integralização, revemos o conceito de interdisciplinariedade...
Para ser integrado não preciso que meu colega trabalhe o mesmo tema que eu, mas deve-se compreender que o conteúdo por si só é interdisciplinar porque ele é histórico, é geográfico, é expressivo, é linguagem, etc.
O que diz nosso PPP (p.60):
De outro modo, vale dizer que quando o professor trabalha com o conteúdo é preciso ter em mente que ele expressa um recorte de uma totalidade. Ao ser contextualizado para o aluno necessariamente o próprio professor de uma disciplina busca relações que suscitam conhecimentos de outras disciplinas como a condição de compreender o conteúdo em sua totalidade.
A título de exemplo temos que o professor de Biologia ao trabalhar Bioma transita necessariamente pelas transformações ambientais advindas do processo histórico de colonização que teve como consequência a migração de populações descendentes dos africanos remanescentes da escravização e dos quilombolas. Esta é uma relação inerente ao conhecimento e não artificializada.
Portanto, é o conhecimento que é interdisciplinar e não a metodologia do professor. Não existe como fazer interdisciplinaridade. Ela não é uma opção metodológica e sim epistemológica. Significa dizer que o professor, ao trabalhar seu conteúdo, rompendo com a visão fragmentada, tecnicista e mecanicista acaba abordando-o de maneira interdisciplinar. A interdisciplinaridade é, portanto, condição de compreensão do conhecimento em sua totalidade. Significa dizer em outros termos, também que quando se tem um olhar transdisciplinar - em termos de concepção ou visão de mundo – a abordagem com o conteúdo é interdisciplinar.
Professores C.E. Santa Gemma Galgani - Curitiba/PR
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