O currículo
O que ensinamos, hoje no meu ponto de vista é parte da educação institucionalizada a mais de um século, com enormes falácias e reformismos, pequenas modificações e ajustes, que infelizmente continuam, ainda servindo basicamente para fornecer, segundo (Mézaros, 2007), “os conhecimentos e o pessoal necessário à máquina produtiva em expansão do sistema capitalista como também gerar e produzir um sistema de valores que legitima os interesses dominantes”.
Os inúmeros determinantes de tal realidade são produzidos e mantidos tanto pelas ações do Estado quanto pela prática da grande maioria dos educadores que, sujeitos de uma dada realidade histórica que frente a ideologia dominante e aos inúmeros reformismos se movimentam em favor de uma escola de cultura humanista para os ricos e outra escola pobre para os filhos dos trabalhadores, como a muito é confirmado por inúmeros pesquisadores.
Muitos professores e eu mesma no interior da escola participamos de discussões a cerca das mudanças necessárias, para o Ensino Médio, tanto no tocante aos espaços e tempos do curso, quanto nos conteúdos que ensinamos. No tocante aos conteúdos de ensino e as metodologias de abordagem, falta domínio teórico, conhecimento de mundo e da ciência que ensinamos, além de capacidade técnica que nos habilite trazer para o centro do debate pedagógico da sala de aula, os problemas da vivência dos jovens do ensino médio tanto, no âmbito das questões culturais, históricas e tecnológicas, para discuti-las de maneira contextualizada e abrangente, quanto, estrutura escolar menos fragmentada em seus tempos, número de horas aulas, por disciplinas e carga horária menos fragmentada.
Analisando esta abordagem percebo que, na escola onde atuo – escola, de um bairro industrial -, muitas vezes sou considerada incompreensível, pouco clara em minhas defesas, ou por vezes utópica demais, na crença de que, o conhecimento é para a classe trabalhadora, o passaporte de superação de subalternidade. Tal constatação decorre tanto da minha condição de trabalhadora, quanto do que venho observando, na vivência dos jovens. Para mim o conhecimento, garantiu uma profissão reconhecida e da qual me orgulho, para os jovens a escola e o que ensinamos, o conteúdo cientifico das disciplinas escolares, esta em último lugar, na lista de suas prioridades – pois o que conta para muitos é arrumar emprego, trabalhar para ganhar dinheiro e adquirir bens matérias – os últimos modelos de celulares - carros e mesmo motos, namorar e curtir a vida. Além disso, há inúmeras situações familiares, afetivas e de trabalho que lhes é posta diariamente, e que os leva a almejar apenas projetos aligeirados, pró - forma. O projeto existente é sempre imediatista ligado as necessidades de consumo e de auto - afirmação pessoal. Ou mesmo de sobrevivência. Poucos jovens traçam um caminho próprio e original. Frente a este quadro e a própria realidade escolar, é muito difícil trabalhar para a formação de pessoas com visão ampla, complexa, de longo alcance. Muitos assumem o discurso dominante, sem se perceber explorados. Outros se tornam alheios e embora se percebam explorados, não encontram o alicerce necessário para transpor as dificuldades.
A educação que penso ser necessária e o que procuro ensinar nas disciplinas de história e filosofia, é aquela que nos habilite a pensar como os sujeitos de outros tempos e espaços, se organizaram para vencer as circunstâncias do tempo, do espaço e das relações sociais. A importância, do saber teórico prático, necessário para superar a dicotomia “os que pensam e os que executam” na sociedade de classe. Mudar esta realidade é possível desde que tenhamos uma postura organizadora e disciplinada de estudo e trabalho, que nos eleva a uma consciência superior ao imediatismo.
Nas discussões ficou evidente que há por parte da maioria dos professores uma dificuldade em entender a finalidade principal da Educação Básica e de sua finalidade na formação integral dos sujeitos do Ensino Médio. Evidenciou-se também, que alguns professores não conseguem realizar a “transposição didática”, isto é não conseguem tomar da realidade empírica dos alunos, os conhecimentos da realidade e devolve-los novamente para a realidade transformados/ iluminados pelo conhecimento científicos produzidos pela humanidade”. Outros professores procuram maneiras de considerar os avanços tecnológicos e culturais de sua disciplina, e os articulam a realidade imediata buscando a formação de sujeitos do mundo e não apenas para o mercado de trabalho.
É notório, portanto, que nosso papel na escola não é “o de formar trabalhadores para as empresas”, porém, na maioria das afirmações é este o discurso que vem a tona. “A empresa tal esta ofertando tal curso”. Entendo que o papel da escola, diferente do da empresa é formar para “o mundo do trabalho”, que é diferente e mais abrangente do que formar para o trabalho. Neste último, a empresa deve fazer segundo suas condições e necessidades, a instrumentalização para o trabalho que o jovem vai realizar. A formação sólida nas diferentes disciplinas, nas dimensões do trabalho, da ciência, da cultura e da tecnologia é papel da educação escolar, é trabalho do professor, que ao evidenciar a luta humana em cada época, tendo em vista a superação dos problemas do seu tempo, e de sua cultura, pode apresentar para alunos a seqüência dos esforços, dificuldades, acertos e vitórias pelas quais a humanidade passou. Esta metodologia pode ser mais educativa do que apresentar o conteúdo da disciplina de maneira esquemática.
Ensinar um conteúdo presente no currículo oficial ou nos livro didáticos, produzido para jovens, muitas vezes sem existência concreta, como os alunos que estão a nossa frente, é um desfio constante, se quisermos avançar, precisamos dar a máxima importância, a história da nossa matéria, pois para formar para a vida precisamos contar aos nossos alunos, a luta humana frente às condições do meio e da convivência social. Precisamos recriar estas condições nas situações do presente. Precisamos avaliar se os problemas de matemática, de geometria, de física, de biologia e de linguagem, foram resolvidos para poucos, para muitos ou se toda a humanidade se beneficiou de tais avanços
Percebe-se ainda, que alguns professorem, frente ao jogo de culpados, onde as empresas culpam as escolas pela “pouca qualidade da mão de obra que os jovens estudantes prestam”, sem perceber a falácia e o lugar de quem faz tal afirmação, sentem-se mexidos a formar mão de obra barata e melhor para o mercado. Outros não desejam isto, mas pensam que sua disciplina deve formar para o vestibular. Notei que é preciso deixar claro que nosso trabalho deve estar pautado em uma formação profunda, não doutrinária, mas que parta da experiência profunda entre companheiros. A formação humana é algo lento, que requer vencer etapas, resolver problemas, frente à natureza, a cultura e a sociedade.
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