Ao lermos o texto “Um balanço histórico institucional” temos a impressão de estar andando em círculos no campo educacional, pois, se a educação não nasceu democrática e era acessível a poucos, hoje, quase dois séculos depois, percebemos que continua acessível a poucos, por outros motivos e em outras circunstâncias.
Em discussão com o grupo e como opinião pessoal, analisamos a questão do desafio de encontrar uma explicação para a falta de conclusão da maioria de nossos jovens no Ensino fundamental e é claro que são muitas as questões a serem levadas em conta, mas todas elas acabam de uma forma direta ou indireta na questão familiar.
Há algumas décadas, grande parte das famílias brasileiras eram o que chamamos de estruturas em torno de um núcleo composto pela presença do pai como progenitor do bem estar da família e em alguns casos a mãe surgia também com trabalho remunerado, e ao adolescente em idade de estudar caberia a tarefa de estudar e garantir uma vaga na universidade antes de pensar em trabalho. Hoje o quadro observado, principalmente no ensino médio noturno é bem diferente e possui aspecto irreversível. Grande parte dos lares brasileiros são formados pela figura da mãe e dos filhos. Os jovens se obrigam a ingressar no mercado de trabalho cedo para ajudar a manutenção do lar, e essa fase do início de trabalho coincide exatamente com o ingresso no ensino médio. Perante o cansaço de uma jornada de trabalho exaustiva e a possibilidade de continuar os estudos, normalmente o apelo imediato do salário fala mais alto.
Outra questão discutida ainda é a falta de perspectiva de nossos jovens em relação aos estudos. Eles simplesmente não veem nos estudos uma chave de acesso para melhorar seus padrões de vida. Dizem que os conteúdos são desvinculados de suas realidades e que aquilo não lhes servirá para nada, a não ser obter um certificado de conclusão, e aí entramos em outra questão, que é o aspecto de formação global humano. À escola não cabe apenas ministrar conteúdos que tenham um sentido prático no dia a dia do aluno, caso contrário a escola perde seu sentido de transformadora e passa a ser apenas reprodutora de mão-de-obra.
A grande maioria de nossos alunos é proveniente de lares desfeitos, em que há a presença da mãe ou da avó no papel de mãe e de poucos recursos financeiros. Normalmente são adolescentes que vivem em situação de risco e/ou que já viram cenas de violência dentro de casa, na rua ou no bairro com uma frequência assustadora e nem um pouco saudável para seu desenvolvimento emocional. Alguns são usuários ou dependentes químicos e estão matriculados sob ordem judicial, estes são alunos que a família perdeu o controle e a escola surge como um último recurso de manter o filho em algum lugar seguro. Outros vêm regularmente ao colégio, porém o cansaço do trabalho prejudica muito seu aprendizado, havendo uma defasagem enorme de conteúdos se comparados com turmas matutinas.
Estamos em um impasse na educação, se por um lado o modelo do passado da educação tecnicista em que o aluno tinha a obrigação de passar no vestibular e ingressar em uma faculdade pública não cabe mais nesse momento histórico, por outro lado questionamos em até que ponto devemos “facilitar” ou humanizar os conteúdos para que a aquisição dos conhecimentos científicos necessários para que o aluno possa continuar seus estudos e ter uma boa formação acadêmica não seja comprometida, ou seja, para o ensino médio noturno não se pode haver tanta cobrança pelo fato de o jovem ser também um trabalhador e porque seus interesses estão fora da escola e por outro agindo assim estamos talvez tirando a chance de competição por uma vaga, tanto na universidade como no mercado de trabalho, porque, quer queiramos ou não, ele fará a inserção no trabalho e não há como fechar os olhos a essa realidade.
Esses são apenas alguns dos aspectos discutidos no primeiro encontro e para os quais buscamos, como todos, respostas que possam amenizar a angústia que tomou conta da educação brasileira de forma geral, mas principalmente no ensino médio noturno, e para os quais ainda não chegamos a uma solução satisfatória. Quanto à universalização do ensino médio temos ainda um longo caminho de planejamentos, tentativas e muito estudo dessa problemática antes de podermos responder se essa abrangência tão almejada será possível na prática, e não de forma somente teórica.