Etapa I - Caderno IV - ÁREAS DE CONHECIMENTO E INTEGRAÇÃO CURRICULAR

ÁREAS DE CONHECIMENTO E INTEGRAÇÃO CURRICULAR

DORIGO, Silvana¹; HUSAK, Wanda S.¹; TAVARES, Rubens¹; MACEDO, Orlando de¹; ACCO, Tania¹; BARNABɹ, Valtemir; PREGOLINI, Oswaldo¹; GIANOTTO, Rosa do C. L.¹; SKROBOT, Rosangela A.¹; PSZYBYLSKI, Rafael F.¹; SMANIOTTO, A. WOJTECKI, Thiago J.¹; FANK, Elisane²; RODRIGO, Carolina M. P.²; SILVA, Sergio L. A. da¹; ROSA, Érika G. da³.

1 Professores da Rede Estadual de Ensino do Estado do Paraná, Membros do Grupo de Estudos Pacto Nacional pelo o Fortalecimento do Ensino Médio do Colégio Estadual do Paraná/ Turma 2.
2 Professoras Pedagogas da Rede Estadual de Ensino do Estado do Paraná, Membros do Grupo de Estudos Pacto Nacional para o Fortalecimento do Ensino Médio do Colégio Estadual do Paraná/ Turma 2.
3 Professora Pedagoga da Rede Estadual de Ensino do Estado do Paraná, Orientadora de Estudos do Pacto Nacional para o Fortalecimento do Ensino Médio do Colégio Estadual do Paraná/ Turma 2.

Fomento para a Formação de Professores da Escola Pública – Fundo Nacional de Educação (FNDE) - Programa do Ministério da Educação, Governo Federal, Universidade Federal do Paraná, Secretaria de Educação do Estado do Paraná.

1 INTRODUÇÃO

O Caderno IV da Etapa I do Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio aborda as áreas do conhecimento e a integração curricular, a formação da ética e o desenvolvimento da autonomia moral e intelectual.
Visa o pensamento crítico, compreensão dos fundamentos científicos e tecnológicos, relacionando teoria com prática.
Um currículo integrado no Ensino Médio pressupõem estruturas lógicas das disciplinas como uma melhor forma de promover uma formação que leve ao desenvolvimento humano integral dos estudantes.
No entanto, não pode deixar de considerar a importância dos saberes advindos das disciplinas científicas, uma vez que nosso modelo de sociedade está organizada fundamentalmente pelas referências dos conhecimentos científicos e tecnológicos. Negar o direito do educando a esses conhecimentos significaria, portanto, negar-lhe o direito à vida socialmente organizada. (Caderno IV PNEM, p. 08).
Na história da educação, quando se buscam melhorias dos processos de ensino e aprendizagem tendo em vista uma melhor compreensão da realidade e dos conteúdos culturais, a questão da integração curricular tem se colocado como uma possibilidade pensada a partir de diferentes pressupostos educativos e pedagógicos, onde necessitam aprofundamentos nos seguintes aspectos:
1º Áreas de conhecimento relacionadas ao currículo;
2º O ensino integrado: trabalho, ciência, tecnologia e cultura;
3º Caminhos para as aproximações dos conhecimentos entre as diferentes áreas: O trabalho como princípio educativo e a pesquisa como princípio pedagógico;
4º O projeto curricular e a relação entre os sujeitos e suas práticas.
Aspectos esses que conduzam a tecnologia para o mundo, utilizando-se da ciência do conhecimento.

2 O QUE SÃO ÁREAS DO CONHECIMENTO
Organização
Rafael Felipe Pszybylski
2014

O desenvolvimento da ciência no século XX dependeu substancialmente de um fato: quanto mais a ciência se especializou e se diferenciou, maior o número de novos campos que ela descobriu e descreveu.
Na cadeia da produção do conhecimento inseriu-se o ensino. Assim, faz-se uma transposição dos campos científicos para as disciplinas escolares.
As disciplinas escolares, quando consideradas isoladas e desprendidas da realidade concreta, não permitem que o processo de ensino e aprendizagem resulte efetivamente na compreensão da realidade pelo educando.
Os campos científicos (disciplinas), mesmo tempo que são específicos, podem ser reagrupados em torno de uma unidade, Aí se pode ter, então, o que chamamos de áreas científicas. Exemplo: Área das Ciências da Natureza: Física, Química e Biologia- cada um desses campos aborda a natureza que, em si, se constitui como uma unidade — vida, matéria e transformação .
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM) orientam a organização do currículo em Áreas de Conhecimento, correspondentes aos propósitos do Ensino Médio: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas.
As áreas de conhecimento na organização curricular, portanto, devem expressar o potencial de aglutinação, integração e interlocução de campos de saber, ampliando o diálogo entre os componentes curriculares e seus respectivos professores, com consequências perceptíveis pelos educandos e transformadoras da cultura escolar rígida e fragmentada.
Trata-se de um tipo de organização que tem a interdisciplinaridade como princípio. Esta, por sua vez, não é um processo interno somente às respectivas áreas, mas também entre os componentes curriculares de outras áreas.
Assim, contextualizar o conhecimento não é exemplificar em que ele se aplica ou que situações ele explica, mas sim mostrar que qualquer conhecimento existe como resposta a necessidades sociais. Estas, por sua vez, são históricas e também produto de disputas econômicas, sociais e culturais.
A organização do currículo em áreas de conhecimento não deve substituir a especificidade de cada componente curricular. Nesse sentido, é oportuno dizer que, ao ressaltarmos a necessidade da manutenção da especificidade de cada campo do saber, expressa nos componentes curriculares, não estamos defendendo a compartimentalização e o isolamento dos saberes. Muito pelo contrário, as áreas podem expressar uma interessante unidade composta por uma diversidade que se articula e se comunica entre si.

2.1 REFLEXÃO AÇÃO – FILME A VILA – RISCOS DE INTERCONECTAR “NOSSOS PEQUENOS MUNDOS”

A história se passa em uma comunidade rural ambientada no século XIX, autossustentável, administrada por um conselho de anciãos. Além da vila, há outros dois ambientes no filme, o bosque e a cidade.
O primeiro é habitado por criaturas perigosas, já o segundo é apresentado como lugar do crime, da violência, do mal.
O bosque é cercado por um grande muro com cerca elétrica e câmeras de monitoramento, com a presença de vigias motorizados. Ultrapassar essas fronteiras traz um enorme risco.
Uma medida de segurança é adotar o princípio do acautelamento, da preservação — elaborar e fixar formas para coibir ou inibir as possibilidades de conexão entre esses mundos.
Os professores do Colégio Estadual do Paraná – Turma 2 PNEM, realizaram as seguintes reflexões:

Nossa formação na graduação pode revelar algumas dessas questões, não fomos formados à pensar sobre conexões entre as disciplinas. Isso de alguma forma nos dá segurança, ou seja, trabalhar com temas diretamente ligados à nossa disciplina. Assim o filme possibilita discutir exatamente esta metáfora, o perigo de acreditarmos que estamos sempre certos e não fazermos relações com o mundo exterior. A relação com este mundo exterior pode ser entendida, no interior da escola com o diálogo entre as disciplinas, próximas da nossa enquanto conhecimento ou até mesmo outras com outros conhecimentos. A interdisciplinaridade, nesse caso, acaba permitindo a construção de conhecimentos que a disciplina, se trabalhada de maneira isolada não permitiria.
Professora de Biologia: Wanda Husak.

Penso que o ensino deve se dar nessa perspectiva renascentista, da integração, da totalidade em detrimento da fragmentação, no entanto tenho muitas dúvidas quanto em se pensar em grandes áreas do conhecimento para o ensino da educação básica.
Vejo que em cada área específica a interdisciplinaridade ocorre e deve ser explicitada, especialmente em contexto de ensino e aprendizagem, até por que ninguém produz conhecimento sem o auxilio de outras disciplinas ou áreas, assim é que se faz Ciência.
A unidade se dá dentro dos campos específicos ao encontro da totalidade, dos contextos e das metodologias. O objeto é o mesmo num mesmo campo, mas o olhar, as perguntas, os recortes, os métodos marcam uma diferenciação na construção de um modelo explicativo.
O filme é instigante nesse sentido de metaforicamente criar realidades inquestionáveis, fechadas, dogmáticas e nos convida a pensarmos a nossa vida, nossas concepções, se estamos abertos a novos tempos, e nos perguntarmos sobre o caminho que estamos seguindo é o que melhor responde as nossas necessidades e questionamentos da realidade presente.
Professora de História: Rosa Gianotto.

Já é do conhecimento de todos os debates em torno da questão sobre a necessidade do repensar a formação superior no campo das licenciaturas, por outro lado estamos longe de um consenso, por outro lado, não se vê ainda iniciativas significativas no sentido de trazer alguma mudança.
Pensar a interdisciplinaridade, exige muito mais do que práticas isoladas, é essencial que haja uma intenção coletiva, mesmo porque quando assumimos nossa função de professor, a primeira preocupação é em elaborar um bom planejamento das minhas aulas e articulando os conteúdos com metodologias e práticas, que a partir do meu entendimento levará meus alunos ao aprendizado, isso se reproduz em todas as disciplinas, mesmo porque esta foi a formação recebida. O que a realidade nos tem apresentado é um isolamento das áreas de conhecimento, mesmo porque o novo e o desafio de se estabelecer um diálogo, motivado pela escassez do tempo pela demanda de trabalho, reforça a continuidade do que vem se reproduzindo a muito tempo.
Compactuo com a fala da Professora Rosa onde diz “A unidade se dá dentro dos campos específicos ao encontro da totalidade, dos contextos e das metodologias.” Porém pensar a interdisciplinaridade numa prática concreta que consiga interferir na qualidade da relação ensino aprendizagem só acontecerá quando houver uma mudança estrutural, na organização das grades de conteúdos a partir de um diálogo aprofundado entre as áreas do conhecimento realizada de forma institucional, em todas as esferas e modalidades de ensino.
Com este posicionamento não quero dizer a interdisciplinaridade não aconteça, mesmo porque são muito os professores que a medida de suas possibilidades se dedicam em se articular com outras áreas do conhecimento e enriquecem suas práticas..
Professor de Sociologia: Valtemir Barnabé.

A interdisciplinaridade ainda é um mito porque ela exige necessariamente uma mudança de práticas. Só há um lugar em que o conhecimento não se dá de forma interdisciplinar: na escola. Isto é contraditório, mas responde à fragmentação positivista do conhecimento que a concepção de organização do currículo em áreas tenta sanar. Entendo que a grande metáfora do filme esteja nesse liame bastante tênue entre prudência e ousadia, entre dogmatismo e transgressão, entre não repetir o passado e inovar de forma imediata… Para tanto, será necessário adaptar os conteúdos a situações reais de aprendizagem. Pense-se, por exemplo, na situação em que um adolescente precisa criar uma música a respeito de determinado assunto: nesta tarefa, estão envolvidos vários conhecimentos de várias áreas, como sociologia, história, literatura, língua portuguesa, matemática, física e artes, para ficarmos com as disciplinas diretamente relacionadas à concepção musical. Quando ele cria, envolve todas as áreas num processo dinâmico e multifacetado, cuja separação da grade curricular proposta na escola vai totalmente contra. Ele não fragmenta as coisas e caso precise organizá-las, o faz de maneira subjetiva e conforme a necessidade advinda do momento criador. Por isso, há uma dificuldade enorme de se entender o uso e a efetividade de determinadas práticas sugeridas pelos seus professores. Desse modo, entendo que a interdisciplinaridade só será possível quando a escola for outra – do seu ambiente aos seus professores – pois não é possível integrar currículos, estando pautado em grades estanques, em conteúdos dissociados da realidade e em práticas que não contemplem situações reais de aprendizagem. Já pararam para pensar que a Feira Cultural poderia acontecer de segunda a sexta-feira, em todos os dias letivos. E daí, haveria uma semana para ensinarmos o aluno a ser um ser formatado, que é o que fazemos ao longo do ano.
Professor de Português: Adriano Smaniotto.
Creio que o Ensino Médio nunca foi tão pensado e repensado, como agora. No entanto percebo que todos nós, professores e professoras, estamos em processo de construção de ideias e métodos, e em busca por efetivos resultados. Esses resultados devem possuir uma identidade com a problemática existente entre o cotidiano de nossos alunos e suas expectativas. Questiono a forma de reorganizar os conteúdos, quais conteúdos, a divisão em áreas de estudos ao invés de disciplinas. Fica evidente que novas rotinas de trabalho deverão ser utilizadas para estas mudanças de práticas profissionais. Vejo com curiosidade e esperança essa mudança, porque a juventude brasileira clama por um espaço maior no mundo do trabalho e, sempre, esbarra na trave da falta de experiência. Essa juventude merece o socorro de cada um de nós. Suas necessidades já não são tão parecidas com aquelas que, um dia, contemplamos. Um novo e internacional mundo se apresenta através de redes sociais e e-nuvens de todo tipo. Muitas são as interações entre pessoas de continentes distintos. Acredito que a efervescência do momento irá orientar esse grande processo e toda a sociedade para um novo Ensino Médio, capaz de auxiliar no resgate da juventude brasileira.
Professor de Matemática: Sergio Luiz Silva.

O Filme A Vila vai muito além da metáfora proposta. O filme expressa o isolamento dos moradores da Vila em relação aos riscos das cidades. Criamos florestas e criaturas para nos proteger da realidade como se, com isto, pudéssemos nos proteger dela. O isolamento que criamos é da própria escola em relação à sociedade. Portanto, na escola, muitas vezes criamos florestas e criaturas que nos protegem da realidade que está circunscrita no entorno, mas que se expressa dentro da escola mesma. Não concebo que a problemática está no isolamento da disciplina. Há algo anterior que a análise do filme nos possibilita: o isolamento do real. Somos condicionados e condicionantes das condições concretas da materialidade. Somos a maior expressão do que está inerente às contradições do estado capitalista contemporâneo. Somos impregnados das verdades e dos valores deste modo de produção, a tal ponto que já naturalizamos as relações de desigualdade, preconceito, submissão e alienação. Reproduzimos a cada dia os valores deste contexto e ainda assim entendemos que na escola estamos protegidos do que aliena, submete e perverte. Não é o fim do isolamento das disciplinas que romperá com o olhar fragmentado, cartesiano, autoritário e muitas vezes torpe em relação ao real. Como diz o provérbio cristão: não se coloca vinho novo em odres velhos. De nada adianta uma nova proposta de relação interdisciplinar se não abrirmos os muros das florestas e matarmos as criaturas que nós próprios inventamos para nos proteger do mundo real. Um olhar sobre a totalidade significa que a partir de cada especificidade do conhecimento possamos trazer o contexto do real para dentro da escola: de forma organizada, fundamentada, crítica, problematizada e problematizadora. É preciso problematizar o real para formarmos jovens que se posicionem dentro da sociedade . Não podemos criar Vilas. Temos que olhar o real na totalidade como bem coloca como a prof Rosa. O fim das disciplinas guarda um grande paradoxo: podemos abrir os muros da disciplina e fechar os da escola se não entendermos que o concreto é síntese de múltiplas determinações, como afirmou o velho Marx. Este concreto tem que ser dialeticamente questionado, fundamentado e transformado. Não é no senso comum ou mesmo com a superficialidade do conhecimento que isto ocorrerá. As disciplinas curriculares guardam a possibilidade interna de aprofundar o real a partir da matriz de referência que se produziu na história da produção do conhecimento e se organizou na escola de forma especializada. O olhar sobre a realidade já é em si interdisciplinar. Não se trata então em fazer atividades que proporcionem a interdisciplinaridade. Esta relação está na concepção de mundo; ela é epistemológica e não metodológica. O olhar da totalidade sobre o real já é interdisciplinar. E por fim lembrar que só existe interdisciplinaridade no currículo se este for disciplinar. A disciplina é necessária para aprofundar o conhecimento escolar organizando o conhecimento do e sobre o mundo. Não se trata de romper com os muros da disciplina, isto é um risco como nos adverte a Rosa. Trata-se antes de romper com a grade curricular tecnicista e taylorista que divide o currículo de forma pormenorizada e mecanizada. Trata-se antes de romper com os muros da escola que se separa da realidade, embora a reproduza diariamente. Trata-se de matar as criaturas que estão em nossas mentes quando demonizamos a própria tecnologia e queremos fechar as portas da sala “salvando” os alunos do apelo que as redes sociais trazem, a cada dia, virtualizando o real e as relações. Trata-se de romper com a visão cartesiana que dualiza o bem e o mal como se fossemos os paladinos do bem. Trata-se, portanto, de sairmos da Vila e mudarmos para a cidade enfrentando as contradições do real na sua totalidade.
Professora Pedagoga: Elisane Fank.

Caso seja feita uma comparação, um tanto ordinária, o isolamento dos(as) moradores(as) que fundaram a vila se deve ao fato de terem tido experiências violentas nas suas vidas. Na escola, as experiências ruins ou frustradas também são o principal motivo para não se tentar práticas que proporcionem uma maior interação entre os conteúdos das diversas disciplinas. A falta desse processo se deve a uma formação inadequada ofertada pelas instituições de ensino superior. Isso compromete qualquer tentativa de se trabalhar em grupo, uma vez que não há espaço para discussões ou tentativas para novas propostas – sem contar na falta de planejamento, métodos e avaliação necessários ao processo. O comodismo dos(as) professores(as) também é outro fator que interferem no trabalho do cotidiano escolar. A falta de comprometimento com a profissão ainda é bem presente e dificulta qualquer tentativa de incentivo a mudanças. Por fim, a velha crença de muitos(as) profissionais nas suas práticas consagradas que se perenizam ano após ano. No entanto, como no filme, há um momento em que se deve romper com um passado criado na tentativa de se melhorar o que está posto. E isso só acontece quando uma escola tem gestores competentes, equipes pedagógicas atuantes e profissionais nas salas de aula com uma formação adequada para que se concretizem as mudanças necessárias.
Professor de Português: Orlando Macedo Junior.

Acredito que, ao não praticarmos a “conexão” entre nossos “pequenos mundos”, tentamos, na verdade, evitar riscos que possam abalar nossa segurança. Afinal, para praticarmos a intertextualidade no ensino dos conteúdos elencados no planejamento de nossas disciplinas, precisamos ir “além”, e “ir além” significa conhecer outros “mundos”, ou seja, outros aspectos do conhecimento que fogem um pouco da “gaveta”das disciplinas. Isso não significa atribuir-nos uma “culpa” por falta de esforço ou competência, pelo contrário, a grande maioria dos professores está aberta e disposta a desafios e mudanças no encaminhamento do processo de ensino-aprendizagem. Todavia, “transitar entre mundos diferentes”, isto é, usar a intertextualidade como elemento essencial na prática do ensino é algo para o qual não fomos formados, e, embora reconheçamos sua importância, ainda precisamos transpor os primeiros limites e enfrentarmos o medo das “criaturas do bosque”.
É necessário, todavia, enfatizar que não é a organização do currículo por disciplinas que dificulta ou impede a “conexão” entre nossos “pequenos mundos”. Essa dificuldade não desapareceria numa outra organização de currículo; é preciso, antes de mais nada, uma mudança significativa na concepção de ensino.
Professora de Português: Tania Maria Acco.

3 O ENSINO INTEGRADO: TRABALHO, CIÊNCIA, TECNOLOGIA E CULTURA

  O ensino integrado visa integrar no seu desenvolvimento as dimensões da própria vida social, sintetizadas no trabalho, na ciência, na tecnol0gia e na cultura.
As novas DCNEM nos dão pistas nesse sentido, ao apontarem as dimensões do trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura como eixo integrador entre os conhecimentos de distintas naturezas, contextualizando-os em sua dimensão histórica e em relação ao contexto social contemporâneo. (Caderno IV, p. 20).
A perspectiva de formação para o Ensino Médio é atrelar o trabalho, ciência, tecnologia e cultura como formação humana integral no currículo das escolas, de forma transformadora e consciente.

Diferenciamo-nos dos outros animais pela nossa capacidade de gir, não apenas institivamente ou por reflexo, mas intencionalmente, em busca de uma mudança no ambiente que nos favoreça. (Caderno IV, p. 21).
Como coloca Cortella (2011, p. 37), “o trabalho, é, assim, o instrumento de intervenção do humano sobre o mundo e de sua apropriação (ação de tornar próprio) por nós.
A cultura é o próprio ambiente do ser humano, socialmente formada com valores, crenças, objetos, conhecimentos, etc.
Reconhecer tanto a ciência quanto a tecnologia como produções humanas, resultados de uma ação transformadora consciente do ser humano, é caracterizá-las como parte da cultura.
Segundo Vieira Pinto (1979, p. 83) “a ciência é a forma de resposta adaptativa de que somente o homem se revela capaz por ser animal que vence as resistências do meio ambiente mediante o conhecimento dos fenômenos, ou seja, mediante a produção da sua existência, a individual e a da espécie”.
Mesmo não sendo simples definir tecnologia, podemos considera-la como uma coleção de sistemas, incluindo aí não apenas instrumentos materiais, mas igualmente tecnologias de caráter de organização (sistemas de saúde, de educação), projetadas para realizar alguma função. (Caderno IV, p. 24).

3.1 CARTA 195 “VAN GOGH” – REFLEXÃO AÇÃO – DIMENSÕES CULTURA, TRABALHO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA – MATERIAL PARA DISCUSSÃO EM SALA DE AULA: CONTEXTO E OBJETIVO

No trecho retirado do livro Cartas a Théo Vicent Van Gogh são compiladas cartas que o pintor holandês enviou a seu irmão, no período de 1875 até sua morte em 1980. A carta trabalhada é a de número 195 que se refere-se ao seu trabalho e aos instrumentos que tinha disponíveis na época, abordando as diferentes técnicas de pintura, à forma de como a natureza pode ser captada a partir de cada uma delas e, ao mesmo tempo, já trazendo dúvidas sobre o papel do instrumento tecnológico.
Com base neste texto a reflexão ação para os professores são:
1. Destaque as dimensões da cultura, trabalho, ciência e tecnologia presentes no trecho da obra:
2. De que forma o trecho pode ser incorporado como material de discussão na sala de aula? Em que contexto e com qual objetivo?
1. Faz-se necessário, a partir da leitura do fragmento entender a articulação entre cultura, trabalho, ciência e tecnologia. Neste caso a cultura deve ser vista como um processo social constitutivo através do qual e por meio do qual os seres humanos transformam seu cotidiano, sobretudo quando relacionamos o homem e a natureza. Os interesses comuns da sociedade, quase sempre foram direcionados para produção e geração de conhecimentos, assim o conhecimento é produzido no interior das sociedades buscando sempre o bem comum e a ciência, enquanto conhecimento necessita de uma organização, uma sistematização para que se transforme em instrumento material, e como tal auxiliar no trabalho humano.
Vale ressaltar que ao afirmar em certo momento, olhando para o passado reconhece que não estando lá não tinha condições de falar sobre o assunto. Esse aspecto revela um fator importante quando tratamos de alguns temas em sala de aula, ou seja, a ciência não pode trabalhar com achismos, pode sim, a partir de hipóteses, levantar questões de análise para se chegar a determinados resultados.
2. Um primeiro ponto é considerar que mesmo Van Gogh, um pintor com qualidades sem igual aponta outros pintores do passado importantes ao ponto de citá-los. A memória e muito relevante no contexto de sua discussão, assim o trabalho em sala de aula com o texto pode extrapolar sua dimensão de arte e fluir para a relação com a própria química quando cita, na última parte do fragmento: “Com carvão mergulhado na água pode-se fazer coisas excelentes, pude ver isto com Weissenbruch; o óleo serve para a fixação e o preto torna-se mais quente e mais profundo”.
O contexto pode ser a ideia de memória ou mesmo a utilização da química na constituição das cores, tão exploradas por Van Gogh em suas obras.
Professora de Biologia: Wanda Sofia Husak

1- A medida que o homem produz e se produz através da cultura, o tempo e o espaço em que este se encontra pode ser determinante para o modo e estilo que vida que será produzido por este, não fosse a disponibilidade da matéria prima do grafite neste determinado contexto apresentado pelo autor, possivelmente haveria surgido outro formas destes grande mestres da pintura expressar sua arte, como o próprio exemplo abordado no texto quando fala se alguém tivesse inventado uma boa pena, para trabalhar ao ar livre com um tinteiro, haveria muito mais quadros pintados com pena. O texto nos chama a atenção para a capacidade incrível que o homem teve e tem de identificar na natureza condições favoráveis para atender ás suas necessidades com maior qualidade e conforto possível, o que da a tona da diversidade cultural produzida ao longo da história do homem. Importante lembrar que a dimensão de importância que se dá para a ciência na atualidade é fruto de uma longa caminhada, considerando que a medida que o homem através do trabalho transforma a realidade a sua volta ele não só produz cultura como também em alguma dimensão dá sua contribuição para a ciência e a tecnologias.
2- O texto é um material muito rico para abordagem de diversos conteúdos trabalhos na disciplina de sociologia, é um enunciado para discussões sobre temáticas como o mundo do trabalho, cultura, diversidades cultural, papeis sociais, entre outros. Importante destacar a função que o texto exerce de proporcionar o registro das memórias e história, que contribui para uma reflexão mais aprofundada quando das análises das obras destes grandes mestres das artes.
Professor de Sociologia: Valtemir Barnabé

1. O excerto lido nos permite perceber o quanto os meios podem influir na técnica com que se elabora algo – os pincéis e grafites adequados, nesse caso – todavia nos remete para o fato de que não são fundamentais à criação, como se vê na escolha de Van Gogh em não usar a técnica de carvão, pois prefere “que a beleza não se deva ao meu material, mas a mim mesmo…” Tal escolha dialoga diretamente com o artesão da sala de aula – o professor, pois este não deve ter a tecnologia como fim, mas como suporte, se necessário, para sua aula. Há aulas inesquecíveis que são dadas oralmente e há aulas incansavelmente chatas dadas sob a égide do power point e do quadro digital.
2. A passagem pode ser usada em sala de diversas maneiras, com enfoques variados. Na área de literatura, o fragmento é fundamental para mostrar ao aluno que o artista que alcança destaque no mundo da arte, não surge do nada, mas é, antes, uma resultante cultural do que aprendeu, leu, pesquisou e conheceu. A partir disso, pode-se apropriar o excerto para propor paralelos com outros campos do conhecimento, levando o aluno a refletir o quão necessário é o diálogo e a instrução para que possamos alçar voos inexplorados. De outra maneira, o texto lido serve como alerta para que não coloquemos a “desculpa” da aula ruim por falta deste ou daquele recurso, pois o “amor” sempre partirá de nós, eternos pintores deste quadro mais belo do que nós, a educação…
Professor de Português: Adriano da Rosa Smaniotto

1- A busca por trabalho levou Vicent Van Gogh a fazer inúmeras tentativas até descobrir seu talento para uma pintura que muitos desvalorizaram, em seu tempo. Sofreu muito, mas acreditou cegamente em seu trabalho, mesmo utilizando ferramentas rudimentares. Ele criou um estilo de pintura, ou seja, inventou toda uma cultura de traços e cores fazendo uso de recursos simples como carvão mergulhado em água, sempre com muita persistência, esperança e loucura (por que não?). Seria mentir demais se tentarmos comparar Van Gogh com cada um de nós, professores e professoras?
2- Quando abrimos a porta de uma sala de aula e nos dirigimos ao quadro de giz o que fazemos? Pintamos as cores plasmadas em nossa memória e invadimos o imaginário do estudante criando, nele, uma nova dimensão da realidade e dirigindo sua atenção para novos horizontes. Não importam as ferramentas; pode ser um bastão de giz ou um tablet (de preferência “aquele com uma maçã mordida” – rsrs). No entanto, a ferramenta principal está dentro de cada um de nós: a crença que poderemos mudar o mundo ao prepararmos o estudante para a plenitude dos conceitos que o levem à excelência.
Tiramos muitos coelhos de nossas cartolas, todos os dias, todas as horas, como o pintor fazia e relatava a seu irmão Théo:
“Escrevo-lhe de Saintes-Maries, à beira do Mediterrâneo enfim. O Mediterrâneo tem a cor igual à das cavalas, ou seja, mutante; nunca se sabe se é verde ou violeta, nunca se sabe se é azul, pois no instante seguinte o reflexo mutante toma um tom rosa ou cinza…”
(Cartas a Théo – p.217)
Professor de Matemática: Sérgio Luiz Silva.