Especialistas pedem recursos para jovens

O Brasil vive um “bônus demográfico” que, caso seja bem aproveitado, pode se transformar em um benefício comum a poucos países, como China e Índia. Trata-se de um universo de 21 milhões de adolescentes que, diante de um cenário favorável à inclusão no mundo do trabalho, poderá contribuir para o crescimento do país, com sua criatividade, força produtiva e aptidões. No entanto, é justamente a partir dessa faixa etária que o país registra os maiores índices evasão escolar.

Diante desse cenário, o coordenador do Programa Cidadania dos Adolescentes do Fundo das Nações Unidas para as Crianças (Unicef), Mário Volpi, sugeriu o incremento de investimentos na segunda década da vida dos cidadãos brasileiros durante o seminário “Juventude, educação e trabalho”. O evento foi promovido pela Fundação Roberto Marinho (FRM), em sua sede, no último dia 10.

Nesse encontro, voltado para debater a inserção do jovem no mundo do trabalho, o especialista explicou que as políticas voltadas para a primeira infância trouxeram inúmeros avanços, como a redução da mortalidade infantil e também a universalização do acesso à educação.

No entanto, o Brasil registra elevados índices de evasão escolar e de assassinatos entre adolescentes.
“As reduções da taxa de mortalidade entre 1998 e 2008 mostraram que foi possível preservar a vida de 26 mil crianças. Porém, nesse mesmo período, 81 mil adolescentes brasileiros, com idade entre 15 e 19 anos, foram assassinados. Salvamos a vida das crianças e acabamos perdendo-as na década seguinte”, esclareceu o especialista.

Em seguida, Mário Volpi apresentou os dados do setor educacional, baseado no Pnad de 2011, que indicam a gradativa evasão de adolescentes no sistema escolar. É o ensino médio o segmento de ensino que registra os piores índices: somente 66% dos jovens do Estado de São Paulo, o melhor da lista, conseguem completar essa etapa com até 19 anos. Em Alagoas, que apresenta o pior desempenho do país, apenas 26,7% dos estudantes completam o ensino médio dentro da referida faixa etária.

“A média nacional para esse segmento de ensino é de 51,3%, ou seja, mais da metade dos jovens com até 19 anos não têm o ensino médio completo. A baixa escolaridade aumenta a precarização do trabalho e a manutenção de um ciclo intergeracional de pobreza. Precisamos criar políticas para romper com esse ciclo, proporcionando aos jovens uma educação que desenvolva competências e habilidades necessárias a inserção no mundo do trabalho, bastante impactado pelas novas tecnologias; devemos aprimorar as políticas de profissionalização”, observou o integrante da Unicef.

Gerente geral de Educação Profissional da FRM, Aparecida Lacerda  acrescentou que o objetivo foi reunir pesquisadores da situação da juventude, do trabalho e da educação no Brasil. “A educação profissional só faz sentido quando é casada com uma escolaridade boa e concluída. Não adianta ficarmos apenas treinando mão de obra porque as demandas do mercado mudam. As pessoas precisam ter uma visão de mundo maior e uma escolaridade mais intensa”, observou a gerente geral de Educação Profissional da FRM, adiantando que, no segundo semestre, a instituição deve promover novo debate sobre o tema.

O economista Carlos Henrique Corseuil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), completou a mesa de debates do seminário. A dinâmica de atividades incluiu, também, uma conversa com integrantes do programa Aprendiz Legal. A colaboração da FRM nessa iniciativa proporciona atendimento a mais de 60 mil jovens em todo o país.

Legislação dificulta a efetivação de aprendizes - “O impacto da Lei do Aprendiz sobre a inserção do jovem no mercado de trabalho formal brasileiro”. Essa foi a pesquisa apresentada pelo  economista Carlos Henrique Corseuil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), durante o seminário “Juventude, educação e trabalho”, organizado pela Fundação Roberto Marinho (FRM).

O estudo, realizado com a colaboração de Miguel Foguel (Ipea) e de Gustavo Gonzaga, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), acompanhou, por seis anos, a trajetória de jovens com 17 ou 18 anos que entraram no 1º emprego entre 2001 e 2003 com contratos por prazo determinado. A Lei de Aprendizagem (Lei Nº10.097) foi criada em 2000 e, alterada em 2005. Inicialmente, atendia jovens com idade entre 14 e 17 anos e, a partir de 2005, foi estendida àqueles com idade de 14 e 23 anos.

A legislação determina que empresas de médio e grande porte contratem um número de aprendizes equivalente a um mínimo de 5% e um máximo de 15% do seu quadro de funcionários cujas funções demandem formação profissional. O aprendiz deve, simultaneamente, cursar a escola regular (se ainda não concluiu o ensino médio) e estar matriculado e frequentando instituição de ensino técnico profissional.

Uma das conclusões do levantamento apresentado por Carlos Henrique Corseuil foi que os jovens aprendizes não costumam se efetivados nas empresas em que trabalham. Além disso, demoram um pouco mais a retornarem ao mercado de trabalho após a experiência da aprendizagem. Apesar da demora, os “ex-aprendizes” retornam ao mercado em postos onde há menor rotatividade e melhores condições de trabalho.

“Não podemos dizer se é mais difícil ou não para um jovem que deixa o programa de aprendizagem retornar ao mercado de trabalho. Esse jovem pode, eventualmente, por ter vivenciado essa experiência, em geral em uma empresa grande, buscar a sua melhor qualificação. E por ter entrado em contato com um novo ambiente, procurar por empregos mais estáveis”, ressaltou o pesquisador do Ipea.

Com relação à dificuldade de permanência do aprendiz nas empresas, o especialista informa que, devido à cota da legislação, mesmo gostando do trabalho do jovem, a empresa pode enfrentar dificuldades para contratar o aprendiz. Segundo o economista, uma empresa com 20 funcionários deve contratar um aprendiz. Caso esse jovem seja efetivado, ela passa a ter 21 funcionários. Então, essa mesma empresa precisa ter dois aprendizes em seu quadro — ela fica com um funcionário efetivo e um aprendiz a mais em sua folha; e, nem sempre, há demanda de crescimento de pessoal.

“A sugestão que fica pensar é: a forma como é feito o cálculo da cota pode prejudicar a permanência do aprendiz naquela empresa. Poderíamos criar um modelo no qual a cota contemplasse o aproveitamento do aprendiz pela empresa”, propôs o especialista.

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