Desafios do Ensino Médio: discussões sobre a realidade do Col. Est. Prof.ª Isabel Lopes Santos Souza, Curitiba – PR
Atualmente o contexto histórico, de uma escola para a elite como era no século XIX, não se repete, mas ele se altera muito pouco. Os alunos pertencentes ao ensino médio hoje têm incentivos para continuar seus estudos, mas àqueles que chegam nessa última etapa são poucos. Devido a esse panorama, o que está acontecendo? Onde estamos errando? Se é que o erro parte de uma culpa generalizada por parte do professor, como insistem muitos. Onde está a falta de atrativo para que esses alunos continuem seus estudos até a conclusão do ensino médio, no mínimo. Onde a escola está errando? Onde esses alunos estão errando?
Dentro da realidade da escola onde atuamos, há uma grande massa de alunos que ainda não veem perspectivas de continuidade nos estudos. Os programas sociais que constituem o quadro atual permitem ao aluno que ele siga estudando até a universidade, mas muitos deles já se consideram vitoriosos por cursarem o primeiro ou o segundo ano do ensino médio. Concluir essa etapa da vida escolar é para poucos, infelizmente muitos pensam assim.
Os objetivos atuais refletem a ideia de uma universidade federal como reflexo. Sendo assim, o conceito comum no ensino médio deixa transparecer que somente alunos remanescentes de escolas particulares terão chances. O sistema cobra quantidade e não qualidade. O alicerce deixa a desejar quanto ao ensino, com notas burladas, aprovações forçadas e números maquiados. A retenção de alunos, cada vez mais escassa, deixa que estes favorecidos não alcancem êxito quando atingirem o último degrau do ensino regular. Desta forma a massa tem como reflexo poucas opções. Àqueles que conseguirem chegar ao último nível, levam no subconsciente que uma faculdade particular é o seu destino, e não uma universidade federal, caso ele termine o ensino médio.
Mas a responsabilidade não pode ser transferida somente para uma camada da educação, no caso, os alunos; muitos docentes também contribuem para que esse quadro se agrave no distanciamento dos dias destinados ao estudo. Muitos professores assumem aulas no estado com a ideia de que irão ministrar conteúdos para alunos desinteressados, que não querem nada com nada, que não estão nem aí para o seu próprio futuro. Inúmeros professores são formados com o conceito de que não é preciso se esforçar muito para ministrar aulas em colégios estaduais. “Escolas particulares exigem mais”, “escola pública exige muito pouco”, esse é o pensamento presente em inúmeros casos.
Dessa forma, três eixos se destacam e contribuem para entender a desmotivação atual quanto à educação de qualidade em colégios públicos. O eixo social, a formação do professor e a infraestrutura comprometem e muito a reversão desse quadro que agrava dia a dia a fama dos colégios públicos. No eixo social encontra-se a concepção de um ensino médio autoritário. Um ensino médio que se arrastou até os dias atuais com a ideia de que a sociedade irá definir quem seguirá e quem estacionará no meio do caminho. Como disse uma pedagoga: “é a seleção natural”. Falas desencontradas de docentes de carreira, como: “alguém vai precisar limpar a sujeira do outro”, ou “alguém vai ter que fazer o trabalho sujo da sociedade”, encontra-se presente nesse elitismo construído ao longo dos anos.
Dentro da formação do professor encontramos a visão de mundo daquele professor que foi formado dentro do eixo social. Por isso, em sua grande maioria, os professores são elitistas, e ministram suas aulas pensando naqueles que “querem aprender”.
Quanto à infraestrutura encontramos o grave problema das escolas, em sua maioria sucateadas. Não podemos falar pelos outros, mas dentro da nossa realidade não possuímos sala de arte, o laboratório de informática está destruído, não há laboratório de química, de línguas estrangeiras, de biologia, muito menos uma sala de ciência preparada para receber os alunos. Não há um ambiente para vídeo, um anfiteatro ou qualquer coisa que o valha. Suportamos a falta de estrutura e tentamos fazer muito com o pouco que temos nas mãos.
A imagem ruim, já consolidada, construída ao longo de muitos anos, desmotiva àqueles que pretendem ingressar no sistema. A mácula da escola pública, com suas lendas e histórias, transfere a fama de que nada presta, para o imaginário popular. Na maioria das vezes a comunidade não vê com bons olhos alguns colégios, cuja fama é ruim. Ironicamente a primeira impressão da comunidade não atribui essa má fama ao ensino ou a qualidade de seus professores, mas sim a estrutura física apresentada pelo prédio escolar. Direção, pedagógico, professores e funcionários que trabalham em vários colégios são taxados da mesma forma. Paralelamente a isso, está o conceito de nivelar e caracterizar os alunos como não possuidores de entendimento. Enquanto muitos professores se esforçam para ministrar aulas de qualidade, outros acreditam que a cópia ainda é a solução, pois os alunos não entenderão mais que aquilo. O corpo pedagógico torna-se inimigo de alguns professores quando há uma cobrança de trabalho. Encontrar a “culpa” de quem transformou o sistema como ele está é uma busca constante.
“Devido à falta de criatividade e até de comprometimento de alguns professores as aulas tornam-se maçantes gerando indisciplina dentro das salas de aula”, frase registrada no PPP de nossa escola. Diante da afirmativa, ficam os questionamentos.
Como uma escola vai ser criativa sendo que ela não tem um laboratório de química, línguas, biologia etc.? Como uma escola vai ser motivada sem incentivos aos seus profissionais? Como uma escola vai ser motivada sendo que 90% dos problemas que ocorrem no colégio têm os professores apontados como culpados? Como persistir numa postura crítica com vistas numa educação de fato e de direito, frente aos desafios da falta de segurança, leis ineficientes em relação à regularização do trabalho feito pelo aluno fora da escola? Muitos dos nossos alunos frequentam a escola e trabalham até 8 horas por dia.
Por fim, vemos que a cultura no ensino médio fora produzida historicamente contra uma educação de qualidade. E ficam os desafios a serem combatidos, como:
A falta de perspectivas de vida / dos educandos.
A indisciplina.
Estrutura física da escola.
Pais ausentes / Falta de estrutura familiar.
Integração dos alunos com o ambiente escolar.
Falta de recursos tecnológicos.
Alto índice de evasão.
Problemas sociais: como drogas e insegurança.
O enfrentamento diante do mau uso da tecnologia (celular).
E diante de inúmeros problemas, cuja solução nem é cogitada no âmbito escolar, em reuniões ou discussões esporádicas, como motivar, primeiramente os professores, para que os alunos sintam-se motivados a comparecer no colégio? Como os professores cuidarão dos alunos sendo que o próprio grupo está inquieto?
Em nossa realidade, atualmente não há um espaço para discussões, exposição de críticas e angústias por parte daqueles que trabalham diretamente com os alunos. O trabalho com os jovens fica fadado somente à sala de aula. Situações mal resolvidas são levadas além do contexto da educação, dentro da nossa escola, o que gera insatisfação, discussões pejorativas e problemas de relacionamento.
Por fim, uma possível solução para o problema.
O que percebemos é um sério problema de relação pessoal entre professores, direção, alunos e corpo pedagógico. A solução é persistir numa postura crítica, ética e profissional para que esse problema não continue e siga o mesmo caminho dos problemas eternos que se arrastam há anos. Como o sistema que agora consolidado, transfere uma ideia de que é impossível melhorar.
“O trabalho do outro mal feito interfere no meu trabalho”, diante da seguinte frase não há retorno por parte do corpo diretivo, muito menos respaldo para o profissional que pediu ajuda. Os ânimos se exaltam com uma sugestão, crítica, ou colocação e há muito pouco espaço para o diálogo coletivo dos problemas que estão acontecendo.
Insistir na ética, na educação de qualidade, na postura profissional e na formação do diálogo em grupo, com a busca para a resolução dos problemas é um possível caminho. Conquistar um espaço para conversas deve ser uma busca constante. Examinar e trabalhar na busca de soluções não deve ser âmbito de desistências. Persistir na atitude de educar. Não há razão para desmotivar o grupo devido a um elemento que não quer trabalhar, para esse há outro caminho a trilhar.
Artigo elaborado pelo grupo de professores e coordenadores pedagógicos do Col. Est. Prof.ª Isabel Lopes Santos Souza.
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