O fato de a emissão de discursos que se referem ao ensino médio, quase sempre à margem dos reais desafios históricos, o tem jogado à beira das políticas educacionais do Estado brasileiro, produzindo o retardamento de sua adequada reconfiguração. Quais seriam estes desafios?
Acredito que em primeiro lugar, seria enxergá-lo como nível de ensino e, não , como etapa final da educação básica. Em segundo, atribuir às suas desconformidades, não somente à má formação dos professores (como o Estado faz). Em terceiro, montar instrumentos sofisticados de avaliação sem a participação dos professores e, tanto pior, sem fazer uso dos resultados obtidos e acumulados (caso do ENEM, do SAEB).
Penso que o MEC/Estado sabe que as deficiências do nosso Ensino Médio são gravíssimas. Sabe que, a nossa educação básica deságua em uma educação sem base, o que nos joga de costas para os anseios do desenvolvimento tecnológico do país e do mundo. E, não menos grave, sabe que grande parte dos cidadãos brasileiros é abandonada ao risco de uma cidadania menor. Ou seja, pessoas sem educação escolar básica, sem as precondições para uma aprendizagem profissional dentro das exigências da sociedade do conhecimento.
Tanto é assim que a face do ensino médio só é percebida quando saem resultados incômodos de avaliações ou quando o setor empresarial passa a reclamar do baixo nível de escolaridade dos trabalhadores. Sabe-se que a educação básica que culmina com o Ensino Médio não conta com mecanismos permanentes de indução de políticas educacionais que ofereçam uma escola de alta qualidade. Talvez por isso, o Estado brasileiro aceita a convivência de dois tipos de Ensino Médio: o oferecido pelas escolas federais e pelos colégio universitários (de padrão internacional) e o ofertado pelas redes públicas estaduais, quase sempre hospedado em escolas com todos os tipos de carência, inclusive com um imenso contingente de professores improvisados (que é o caso dos nossos contratados que ora estão aqui ora estão acolá). Neste último caso, parece distante o cumprimento do mandamento legal de preparação do aluno para o exercício da cidadania e para fornecer-lhe os meios de progredir no trabalho e nos estudos posteriores.
Ciente sou de que o atual Ensino Médio público não prepara o aluno para a vida, para o exercício da cidadania, para o mercado de trabalho nem para o ingresso na universidade. É triste perceber que o atual Ensino Médio funciona sem funções demarcantes do ciclo terminal da educação básica, constatando-se assim a falta de uma compreensão ampliada e potencializada de educação básica.
Nosso desafio, portanto, é como transformar esta confusão em clareza.
É fato também que o Ensino Médio brasileiro funciona divorciado do conceito de educação básica e deslocado das necessidades básicas de aprendizagem dos seus alunos. Por isso, considerando a não definição do objetivo do Ensino Médio, há de se concordar com Moaci Carneiro quando afirma "Na verdade, nosso grande problema no Enisno Médio público não é que temos uma escola ruim, senão que não temos escola adequada para este fim. Temos um ajuntamento de pessoas e de atividades, trabalhando em um espaço em que cada um, dentro do possível, tenta ser professor e em que cada escola, dentro do impossível, tenta ser escoa. Por isso, não causa surpresa a revelação dos resultados do ENEM".
Na verdade, por décadas, a escola pública foi laboratório da educação escolar das elites brasileiras, com a massificação do ensino foi cedendo esta condição de vetor de confirmação econômica e social das elites regionais e se transformando numa espécie de "concessão" às camadas populares e aos habitantes das periferias. Por isso, não importa que ela seja eficiente. Importa, sim, e só, que exista! Afinal, "Concessão não é obrigação, é generosidade!"